quarta-feira

À SEGUNDA É DE VEZ




Há pessoas danadas para a brincadeira. Passam a vida a organizar partidas ou "practical jokes", como dizem os anglo saxónicos.
O meu companheiro rotário Miguel Roza, que é médico, conta uma que é de soltar gargalhadas. O caso está publicado no seu livro "De médico e louco de tudo um pouco".
A cena passou-se há umas décadas atrás, no Hospital de São José, em Lisboa.
Havia um clínico pitoresco, que era alvo de alguma troça por parte dos colegas. Estes decidiram-lhe pregar um valente susto.
Um deles telefonou-lhe e identificou-se como agente da Direcção Geral de Segurança. No dia seguinte, iria encontrar-se com ele no hospital para conduzi-lo à Rua António Maria Cardoso, para interrogá-lo.
De imediato, o médico ligou para o seu chefe de serviço que estava a par de tudo. Completamente apavorado, contou-lhe que tinha conversado previamente com o padrinho, oficial do exército. O militar tinha dito ao afilhado para sossegar e que, na pior das hipóteses, ficaria detido um ou dois dias. Mas ele não queria enfrentar a situação. Avisava já o chefe que não iria comparecer ao serviço no dia seguinte.
O seu superior, contendo o riso, afirmou que tal era impensável. Ainda podiam pensar que se tratava de um conluio.
De modo que na manhã seguinte, o atemorizado Dr. Evaristo dirigiu-se ao seu local de trabalho. Foi logo abordado pelo Dr. Raposo, seu chefe de serviço, que lhe disse ter um plano genial: "Quando chegar cá o agente da DGS, eu digo-lhe que tu estás doente e que não podes receber ninguém".
- Mas como é que ele vai acreditar nisso? - perguntou a vítima da brincadeira, já desesperada.
Era mesmo o que o Raposo queria ouvir. Pôde então dizer:
- Bom, então a única solução é engessarmos-te todo, dos pés à cabeça e colocarmos-te numa enfermaria.
Foi-lhe aplicado um aparelho gessado pelvipedálico, que só tinha duas aberturas para as necessidades fisiológicas.
Os colegas iam-no visitando, enquanto ele permanecia imobilizado. Agradecia as palavras de conforto dos colegas, que lhe diziam valer mais aquilo do que ser incomodado pela DGS. E lá permaneceu as 24 horas da praxe, até que foi libertado. Ficou muito grato.
Há pouco tempo, o meu amigo Pedro teve um grande sobressalto. A mulher e os filhos aproveitaram para pregar uma partida, que já tinha sido aplicada com sucesso a um conhecido.
O Pedro adormeceu no sofá, enquanto via televisão.
Com o máximo dos silêncios, os familiares desceram os estores. Tiraram a imagem à TV, mas mantiveram o som ligado. A escuridão era total. Mulher e filhos puseram-se a conversar, em tom de voz elevado. Comentavam o programa televisivo.
O meu amigo despertou, abriu os olhos e não conseguia ver nada:
- Estou cego! - gritou, meio estremunhado, enquanto saía do seu torpor - Onde é que está a televisão?
- O que é que se passa contigo, Pedro? Ainda estás a dormir ou quê? - perguntou-lhe a mulher, gozona.
Ele insistia que tinha os olhos bem abertos, mas que não via nada.