quinta-feira

EU SEI TUDO



Razão de ciência: parece algo de muito sofisticado.
Mas é uma simples expressão normalmente utilizada no tribunal. Significa o motivo pelo qual uma pessoa sabe uma coisa. Por exemplo, uma testemunha diz que, no dia em que a casa foi entregue ao comprador, estava lá instalada uma caldeira de aquecimento. O juiz questiona-o como é que ele tem conhecimento disso. Ele responde que era empregado da empresa vendedora do apartamento e tratou de ir lá verificar se estava tudo em ordem.
É importante descortinar o que está por detrás do conhecimento da testemunha. Assim, avalia-se se o seu depoimento é ou não credível.



PORMENORES

No entanto, o indivíduo que sabe todos os pormenores e recorda tudo com uma exactidão rigorosa acaba por deixar mais dúvidas do que garantir certezas. Dá a ideia de que trouxe tudo muito bem estudado.
O homem que afirma ter almoçado peixe cozido num determinado dia, há dois anos atrás, suscita alguma estranheza. Quem é que se lembra do que comeu há tanto tempo?
Pelo contrário, se a testemunha cometer alguns lapsos, poderá prejudicar ligeiramente uma das partes, mas pelo menos o que afirma será merecedor de maior crédito.
Se uma senhora diz não saber se a carpete ficou danificada em consequência da inundação, estará de certo modo a desfavorecer aquele que pede a indemnização. Mas quando garantir que o valioso quadro e o pavimento ficaram estragados para sempre, já será mais fácil acreditar nessa testemunha. Transparece a noção de que não trouxe tudo muito bem preparado. O que sai da sua boca parece mais natural e espontâneo.



TELEFONE

Recordo muitos casos em que um excessivo detalhe no depoimento da testemunha acaba por traí-la. Aqui vão alguns exemplos.
Eu não vi sangue nenhum e a camisola era de um verde muito clarinho”. Azar: disse a cor do vestuário e não sabia que a vítima se encontrava de luto, conforme tinha sido confirmado por todos.
Sabia o número de telefone dele de cor e liguei-lhe logo. Aliás, ainda o sei dizer”. E disse, segundo a numeração antiga, incluindo o prefixo 01, de Lisboa. Tudo parecia bater certo. Excepto numa coisa. O visado dispunha daquele número, agora iniciado por 21. Mas à data dos factos, a casa estava desabitada e não havia lá telefone.
Eles vivem lá durante o ano todo. Só não tinham consumo de água porque na altura havia uma ligação ao vizinho, que é um senhor que trabalha como serralheiro. Eles até costumam fazer contas à minha frente, em conjunto com as do condomínio. Pagam a parte do homem e depois fazem o acerto com a despesa da água”. O problema é que o serralheiro era inquilino e quem pagava as despesas de condomínio era o senhorio.
O cão nunca fez mal a ninguém. Está sempre preso no canil. Eu estive lá dentro a ver a fossa para libertar os dejectos do animal. A porta do canil tem uma mola e não deixa que ele se solte. Nunca sai de lá”. O dono tinha dito que o cão estava ensinado a fazer as necessidades na rua, mas que o levava sempre pela trela.