quarta-feira

UMA GOTA DE SANGUE




Há cerca de um mês atrás, ainda antes do Natal, a PSP de Santarém deparou-se com um caso curioso.
Nem sempre é fácil apanhar os criminosos quando o alerta é dado já depois de os assaltantes terem deixado o local.
Mas, naquela situação, havia uma pista importante. Não foi desprezada pelos agentes policiais. E assim chegaram aos gatunos.
Tratava-se de um pequeno assalto a uma pastelaria.
Um transeunte reparou que um vidro do estabelecimento se encontrava quebrado.
Tinham sido levados dois televisores e umas quantas garrafas.
O pior é que um dos ladrões fez um corte e começou a sangrar.
Pingava que nem uma torneira.
Os polícias seguiram os pingos. Chegaram aos aparelhos furtados e, depois, aos criminosos.
Devemos dar os parabéns ao popular que denunciou o caso e à autoridade que, num ápice, deteve os larápios.
Já ninguém conta encontrar numerário num café. Muitas vezes, a caixa registadora até é deixada aberta, para revelar que não há lá nada.
O que mais rende é o tabaco. Os maços de cigarros valem um dinheirão, são pequenos e leves.
Se não estiverem numa máquina de distribuição automática, torna-se facílimo encher os sacos. Arrombar a distribuidora é que é mais difícil.

Há cerca de ano e meio, em Alferrarede, nos arredores de Abrantes, ocorreu um episódio interessante, que vai agora ser levado a julgamento.
Numa conhecida pastelaria, a máquina do tabaco foi arrombada. Para além dos cigarros, os ladrões levaram umas pastilhas elásticas e uns caramelos.
Eles eram três, todos já com antecedentes criminais e um longo passado de experiências prisionais: uns catedráticos na matéria…
Um tinha 62 anos, o outro 67 e o mais velho contava 72 anos de idade.
É precisamente este último que se sente mais incomodado por ir a julgamento devido a um assaltozinho a um café, para tirar maços de tabaco, pastilhas e caramelos.
Logo ele, o famoso “Texas”, que sempre cumpriu pena por crimes próprios de verdadeiro burlão e cavalheiro.
Manuel Pires – de seu verdadeiro nome - ficou um pouco zangado com os seus dois companheiros, um dos quais já morreu.
Para já, ele diz que nunca chegou a entrar no estabelecimento comercial. Ficou no interior do carro.
Depois, o que estava em causa não era apropriarem-se do recheio da pastelaria.
Aquilo era um plano muito mais elaborado e altamente sofisticado. Iria deixá-los multimilionários e permitir a reforma definitiva.
O “Texas” sabia da existência de um armazém onde se encontravam dispendiosos jipes.
A primeira coisa era abrir a fechadura do portão. Para isso, era necessário fazer um molde através de um canhão idêntico.
Ora, certa vez, eles estavam no café “O Forno”. O “Texas” viu logo que a máquina dos cigarros tinha uma fechadura idêntica. Bastava lá irem à noite e extraírem o tal canhão.
Depois, ia-se ao armazém. Levavam-se os jipes, arranjavam-se documentos falsos e faziam-se novas matrículas na Bélgica.
A meio do assalto à pastelaria, os outros dois decidiram entreter-se com os cigarros e as pastilhas.
O “Texas” fez questão de dar uma entrevista ao “Expresso”, para recuperar a honra perdida.
Ele não é nenhum pilha-galinhas. Por isso, revelou o seu fabuloso plano, que foi abortado logo no início.
Ah, grande “Texas”! Mesmo quando não dá um golpe tremendo, gosta de se gabar, dizendo que o ia dar.
Agora, meu caro Senhor Pires, fiquei com umas dúvidas.
Pergunto eu: se o plano ia render uma fortuna tão extraordinária, porque não compraram a máquina à dona e não desmontaram tranquilamente a fechadura, na paz das vossas casas?
Depois, há outra coisa: os polícias ficaram convencidos que vocês foram lá em busca de tabaco, pastilhas e caramelos. Os jipes continuavam lá no tal armazém. Por que razão vocês não guardaram segredo? Depois, obtinham o tal canhão e podiam ir lá buscar os veículos, executando finalmente o fantástico plano. Para quê contar tudo e assumir que a golpada falhou?
O Senhor Pires diz que o seu companheiro de 67 anos é troglodita e estúpido. Mas, pelo menos, este não desvendou a existência do tal armazém cheiinho de jipes.
Veja lá se o troglodita e estúpido lhe retribui a gentileza. Ainda o pode tramar no julgamento.