quarta-feira

ARROZ OU BATATAS?




Nos casos de violência doméstica, quase todas as vítimas são as mulheres. O agressor é o marido.
Algumas activistas mais ferrenhas tendem a afirmar que há muitos homens que são maltratados por mulheres. Mas, por uma questão de vergonha e por razões culturais, não são apresentadas queixas.
Eu tendo a pensar que, efectivamente, a esmagadora maioria das pessoas que sofrem maus tratos são mulheres.
Aquilo que os estudos revelam é algo de diferente.
Por vezes, após muitos anos de casamento em que o marido foi maltratando a esposa, dá-se algo de singular. O homem começa a ficar debilitado. A mulher tira partido dessa situação e retribui os maus tratos de que foi vítima.
Durante mais de duas décadas, um homem tinha espancado brutalmente a mulher. Fazia-o com frequência, por tudo e por nada. Umas vezes, devido a ciúmes doentios. Noutras ocasiões, porque se encontrava embriagado. Quase sempre com um objectivo meio inconsciente: subjugar a esposa.
Muitas vezes, insultava-a. Fazia-a sentir que ela não prestava para nada.
Sempre se opôs a que a senhora trabalhasse.
Mantinha-a numa situação de dependência económica. Amiúde, ela pensava em sair de casa e pôr termo àquele inferno. Mas questionava-se como iria viver, sem dinheiro e sem casa.
Até que um dia, o homem contraiu uma doença crónica.
Não se tratava de nada que o levasse à morte. Porém, era o suficiente para lhe causar dificuldades de locomoção, impedi-lo de trabalhar, ter dores significativas e carecer de tomar fármacos constantemente, para além de estar sujeito a acompanhamento médico permanente.
O rancor que a senhora foi guardando transformou-se em desprezo e rapidamente passou a traduzir-se em violência.
Certa vez, estava a aproximar-se a hora do jantar.
Marido e mulher tinham tido uma forte discussão momentos antes.
Ela encontrava-se na cozinha, a preparar a refeição.
O homem abriu a porta e entrou.
No fogão, estava o óleo a aquecer.
A senhora virou-se para o marido e perguntou:
- Queres batatas fritas ou arroz?
E ele deu a resposta:
- O arroz vais dar-me tu!
O indivíduo tinha razão. Se ela já estava a aquecer a gordura, não parecia muito curial indagar se ele preferia batatas ou arroz.
Parecia é que o óleo a ferver teria outra finalidade.
E tinha mesmo.
Ele baixou-se, ao mesmo tempo que dizia esperar levar o arroz. A senhora acabara de lançar o óleo, que não o atingiu por pouco.
Um trocadilho bem mais infeliz foi usado por um indivíduo verdadeiramente sádico.
O hobby dele era a bricolage. Entretinha-se com pequenos trabalhos de marcenaria, que levava a cabo na garagem da sua residência.
Certa vez, a mulher estava com ele naquela dependência. Estalou mais uma das muitas discussões.
A ameaça que ele fez, naquele dia, foi bem pior do que qualquer outra que proferira anteriormente.
É certo que o homem já tinha dito que lhe limpava o sarampo a ela, que ia buscar a fusca e que a matava. Ia preso, mas ela ia para o cemitério.
Desta vez, limitou-se a dizer algo que não parecia muito sério:
- Eu já te lixo!
O mais grave não foram as palavras.
O pior veio quando ele passou aos actos.
Agarrou na cabeça da esposa, com a mão direita. Baixou-a e entalou-lhe a cabeça por debaixo do sovaco, prendendo-a com firmeza.
Esticou o braço esquerdo e alcançou uma folha de lixa. Esfregou-a na face da sua própria mulher, deixando-a toda ensanguentada.