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O QUE UM ADVOGADO DEVE FAZER



Na minha qualidade de formador da Ordem dos Advogados, ensinei várias gerações e aprendi também muito pela troca de impressões com os mais novos, portadores dos mais recentes conhecimentos transmitidos na universidade.
Eis algumas diretrizes.
Um advogado deve fornecer o seu número de telemóvel aos clientes.
Privilegia a comunicação por e-mail. A correspondência é lida quando o destinatário tem maior disponibilidade. Responde-se quando se está mais atento.
Trata os clientes por Senhor e Senhora Dona. No caso dos homens, menciona só o apelido e não o nome próprio. Utiliza os títulos académicos e nobiliárquicos.
As crianças não entram na sala de reuniões ou no gabinete. Aguardam no compartimento de espera, salvo instrução em contrário dos pais.
Na decoração do escritório, o causídico evita as banalizadas gravuras de Honoré Daumier. Dá preferência aos seus gostos pessoais, que revelem a sua personalidade e estilo de vida.
No tribunal, trata os colegas mais antigos na profissão por Senhor Doutor. Cumprimenta os magistrados com um aperto de mão, mencionando o título académico ou o cargo.
Fala respeitosamente com o pessoal administrativo. Pragmaticamente, interessa-lhe tratar bem as secretárias de gabinetes privados ou governamentais.
Ao fotocopiar, digitalizar ou fotografar um processo judicial, retira as folhas do dossiê e volta a colocá-las pela mesma ordem.
É quase obrigatório ter carta de condução. Deve-se dar preferência a um carro híbrido, resistente e de consumo moderado.


QUEIRA FAZER O FAVOR DE OCUPAR O SEU LUGAR

O advogado do autor senta-se na mesa à direita do juiz. Quem representar o réu posiciona-se na tribuna em frente ao colega. Nos processos criminais, havendo assistente ou demandante, o respetivo mandatário fica do lado direito do magistrado do Ministério Público.
No caso de o cliente se encontrar preso, o advogado assegura-se de que ele é o último a entrar na sala de audiências, exceto quando tal for expressamente declarado ser impossível.
É desnecessário gritar, berrar e vociferar contra os magistrados, à semelhança do que fez o antigo primeiro-ministro ao ser interrogado. Mas importa ser firme e inflexível se é tecida alguma consideração que possa prejudicar os interesses do cliente.
Mesmo nos processos mais simples, proferir rápidas alegações orais que não se aproximem dos sessenta minutos pode ser interpretado como desprezo e falta de dedicação ao constituinte.
Ao usar da palavra, se alguém falar simultaneamente, o advogado faz uma pausa até que a outra pessoa se silencie. Se for instado, o advogado esclarece que não gosta de interromper ninguém.
O advogado é cortês para com os jornalistas. Informa-os se os autos se encontram sujeitos a segredo de justiça ou se são públicos e podem ser livremente divulgados.
Recorda sempre as palavras de Luso Soares, para quem a pressa é inimiga da perfeição nas diligências judiciais, em especial nas que envolvem profissionais da comunicação social. O ilustre jurista criticava as detenções ilegais, aludindo a um caso em que “se meteu na cabeça de dois magistrados que semelhante terrorismo é útil, na medida em que fará evitar adiamentos de julgamentos em matéria de imprensa”.
Nos seus anúncios publicitários, o advogado não deve auto-engrandecer-se ou comparar-se a outros colegas. Pode mencionar cargos públicos ou privados que tenha ocupado assim como referir obras publicadas. Na publicidade, ao referir assuntos profissionais em que tenha intervindo, o advogado deve omitir o nome do cliente, salvo se houver autorização expressa.
É benéfico ter clientes avençados que permitam um rendimento periódico. A remuneração deve conter uma componente variável de acordo com o trabalho efetivamente prestado em cada mês. Essa é a forma de nenhuma das partes se considerar prejudicada.



AMBIENTE

O advogado explica aos clientes a diferença entre mandado e mandato. Quando uma pessoa investida de poderes públicos manda alguém cumprir uma ordem, emite um mandado de busca, por exemplo. Ao mandatar outrem, o indivíduo encarrega um terceiro de praticar atos em seu nome. Por exemplo, confere o mandato ao seu advogado para que ele o represente em tribunal.
No tribunal, cada processo tem um número único, a nível nacional. Nas peças processuais, não se indica a secção, o número do juiz ou o apenso. Um lapso poderia originar confusões.
Em processo penal, nas fases iniciais, é necessário apresentar as peças processuais impressas em papel. Não é viável a entrega eletrónica.
Em tais situações, não se entregam duplicados, salvo em recursos e pedidos de indemnização. Por via postal, remete-se apenas uma cópia da primeira página da peça processual. Esta é devolvida depois de aposto o carimbo de entrada, num envelope pré-franquiado dirigido ao causídico.
O advogado respeita o ambiente, evitando dispêndio inútil de papel e tinta. Ao enviar requerimentos pelos correios, não os acompanha por carta a solicitar que se proceda à respetiva entrada na secretaria.
As peças processuais devem ser impressas em papel de cor clara, mas não branca, por forma a que sobressaiam e sejam facilmente localizáveis quando integradas nos autos.
Na correspondência em papel para outros destinatários que não o tribunal, o advogado escreve pelo seu próprio punho as palavras “Exmº Senhor” ou “Estimado Colega”. No final apresenta os cumprimentos e acrescenta, de forma manuscrita, o vocábulo “pessoais”.