O Papa Francisco estará de visita a
Portugal entre 3 e 5 de agosto de 2023, no âmbito da Jornada Mundial da
Juventude.
Nessa ocasião, haverá uma amnistia que
perdoará total ou parcialmente penas de prisão aplicadas a arguidos condenados pela
prática de crimes?
Não. Tal não é verdade. É falso. Não haverá
nenhuma amnistia.
Nenhum recluso condenado a pena de prisão
será beneficiado com a vinda do Sumo Pontífice ao nosso país.
O SOBRINHO
Em 2020, o Parlamento aprovou uma amnistia,
visando algo de muito específico: conceder a liberdade a alguns reclusos, por
forma a minimizar o impacto da pandemia de covid-19 na população prisional.
Nenhuma outra amnistia será concedida.
A questão remonta ao ano de 1999.
Por essa altura, Mota Amaral ocupava o cargo
de presidente da Assembleia da República. Propôs uma amnistia muito alargada,
sob o pretexto de comemorar as bodas de prata do 25 de abril. A lei mereceu
aprovação e muitos saíram da cadeia. Entre eles, contava-se um sobrinho do
próprio político açoriano. O homem cumpria pena por tráfico de droga.
A situação gerou grande incómodo e uma
antipatia generalizada pelas amnistias.
INDULTO
Os indultos presidenciais gozavam de maior
compreensão. Pelo Natal, o Chefe de Estado agracia certas pessoas individualmente,
determinando a sua imediata libertação ou uma redução da pena.
Até ao dia em que foi indultado um sujeito
que já não estava na prisão. Tinha escapado para Cabo Verde.
Acabaram-se as indulgências em massa para
centenas de prisioneiros.
Nos últimos tempos, o Presidente da
República contempla pouco mais de uma dezena de pessoas anualmente.
EMBRIAGUEZ
É verdade que, anteriormente, a visita do
Papa determinava logo uma amnistia.
Em 1982, João Paulo II visitou-nos. O
sistema prisional português sofria um importante processo de humanização
iniciado após a revolução de Abril. Tratava-se de uma contraposição ao sistema
que vigorava no período da ditadura, em que a tortura era uma prática constante
sobretudo relativamente a presos políticos.
O parque prisional mantinha-se, contudo, o
mesmo. Eram insatisfatórias as condições das cadeias, muitas das quais
construídas no século XIX.
A libertação de presos surgia como uma
medida de clemência, que não merecia grande discordância por se associar a um
importante evento religioso.
No dia 1 de junho desse ano, os deputados
votaram favoravelmente a amnistia.
A lei tinha o seu lado cómico. Surgiu com
uma exceção, que incluía um erro ortográfico de palmatória. Não eram agraciados
os indivíduos que tivessem cometido crimes em estado de “embriaguês”,
querendo-se falar nos afetados pela embriaguez. Logo surgiu quem duvidasse da
sobriedade do autor do texto.
REGRESSO
Nove anos passados, o Papa polaco
regressou. Visitou os Açores e a Madeira.
A amnistia veio uns dias antes, para
coincidir com o dia 25 de abril de 1991. Ficaram perdoados muitos dos crimes
cometidos até essa data. Em 4 de julho, o Diário da República publicava o
diploma.
Mais nove anos decorreram e o mesmo João
Paulo II veio a Fátima.
Já ninguém quis falar em amnistias. No ano
anterior, tinha acontecido aquele imbróglio com o sobrinho de Mota Amaral.
RATZINGER
Em 2010, Bento XVI encontrou-se com o
Presidente Cavaco Silva em Lisboa. Visitou o Centro Cultural de Belém e recebeu
José Sócrates na embaixada do Vaticano, a Nunciatura Apostólica.
Não foi sequer considerada a hipótese de
amnistiar quem quer que fosse. Arriscar problemas estava fora de questão.
VÍRUS
O século XXI fica assim marcado por um
único perdão generalizado de crimes, motivado pelo coronavírus.
Foi sobretudo uma matéria de saúde pública
e de razões humanitárias. Não se tratou propriamente de assunto respeitante a
política, religião ou opções de tratamento da criminalidade.
Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco, estará no nosso país, mas nenhum recluso será abrangido por medidas clemenciais.