domingo
MORRER NA ESTRADA
Tem-se falado da responsabilidade dos condutores sempre que há um acidente de viação mortal.
Não havendo feridos ou mortos, a questão é tratada entre as seguradoras. Eventualmente, o culpado poderá ter de suportar as despesas com os prejuízos no seu veículo, se a apólice não cobrir os mesmos.
Quando há danos pessoais, já a sociedade poderá punir o criminoso. As cadeias albergam condutores imprevidentes que causaram acidentes e determinaram perdas de vidas de humanas.
Soube de um caso tão curioso como dramático. Um homem apresentou-se na secretaria do tribunal com uma mala de viagem. Queria cumprir, de imediato, dezoito meses de prisão. A funcionária mandou-o embora. No dia seguinte, lá voltou ele. Não saiu da secretaria. Disse que pretendia falar com o juiz. A funcionária dirigiu-se ao magistrado:
- Lembra-se daquele indivíduo que V. Exª condenou por conduzir embriagado? Acabou por matar uma pessoa. Conduzia a uma velocidade louca, mas mesmo assim ia batendo palmas. Pois ele agora quer ir já para a prisão.
A questão era complexa. Ele tinha permanecido em liberdade durante todo o julgamento. A sentença acabou por situar-se naquele ano e meio de cadeia. Poderia ter apanhado até três anos de prisão.
Desde a leitura da sentença, ele dispunha de mais vinte dias para recorrer da sentença, junto do Tribunal da Relação. No entanto, o homem não tinha interesse nisso. Conformara-se com a decisão. O que mais desejava era começar a cumprir a penitência. Nem conseguia dormir. Passava as noites em claro.
Em princípio, não haveria solução. Ter-se-ia de aguardar que decorresse o prazo de vinte dias. Só depois o juiz poderia passar os mandados de condução à cadeia.
Mas o meu colega fez-lhe a vontade. Mandou chamar o advogado do arguido e o magistrado do Ministério Público. Perguntou a todos se prescindiam do direito de recorrer. Responderam afirmativamente. Iniciou-se então, de imediato, o cumprimento da pena.
Nessa noite, quem não dormiu foi o meu colega. O juiz não deixou de recordar a face do condenado que pretendia ser enclausurado o mais rapidamente possível.
Um casal muito jovem seguia num veículo utilitário. No banco de trás, ia o menino de ambos, com sete meses de idade. Ao volante seguia o pai da criança, sem qualquer cuidado. As consequências foram trágicas. O homem não respeitou as regras de prioridade. Colidiu com outra viatura e a sua mulher teve morte instantânea.
O drama originou um processo judicial com características especiais.
O condutor era arguido, acusado de homicídio por negligência. A criança pedia uma indemnização à companhia de seguros pela morte da mãe. Mas obviamente o representante legal do menor era o próprio pai. A ele não lhe devia agradar ser condenado. No entanto, com certeza convinha aos interesses do menino que o pai fosse declarado culpado. Só assim receberia a compensação.
Foi o que sucedeu. O arguido foi condenado a uma pena suspensa. A seguradora teve de pagar uma valente indemnização ao menor. A respectiva conta bancária é gerida pelo pai, culpado do acidente.