quinta-feira
ALÔ, ALÔ
Paula Neves, conhecida actriz de telenovelas, deu fama aos bonés vermelhos, usados com a pala virada para trás.
Ela perdeu agora uma colega de profissão, que faleceu aos 69 anos de idade: Isabel de Castro.
Algo de dramático ocorreu. A jovem actriz encontrava-se a estabelecer a ligação para o telefone de Isabel de Castro, no preciso momento da sua morte.
Já me sucedeu o mesmo, como aqui relatei há uns tempos atrás.
Eu ia telefonar para uma amiga. Mas naquele instante, ela suicidou-se.
Mais recentemente, no ano passado, liguei para o telemóvel de Henrique Mendes, o grande profissional da televisão. Dava sinal de chamada, mas ninguém atendia.
Telefonei para o hospital e pedi para passarem a chamada ao respectivo quarto. Aconselharam-me a falar com a família. Percebi imediatamente o que se passara. Tinha acabado de falecer.
CONTABILISTA
Há dias, finou-se um grande advogado, que foi meu colega no Centro de Formação da Ordem dos Advogados. Ambos leccionávamos a jovens advogados estagiários.
José Carlos Mira partiu aos 61 anos.
Encontrava-se ao telefone com a sua contabilista. De repente, a senhora deixou de o ouvir. Desligou e telefonou novamente para o escritório dele. Já não voltou a falar com o causídico. Ele tinha morrido.
É claro que houve quem não resistisse a um humor algo negro. Do género de dizer que sempre que se fala com o guarda-livros se fica em estado de coma. Ou que é aconselhável consultar o médico antes de conversar com o técnico de contas. Ou, então, que todos os clientes daquela contabilista se recusam agora a atender chamadas telefónicas dela.
DESMAIO
Nunca estive assim tão ligado a uma morte.
Mas já me sucedeu alguns arguidos desmaiarem. E um deles até foi acometido de um ataque epiléptico.
Um vizinho de meus pais dizia que um grande companheiro dele perdera a vida devido à amizade entre os dois.
Há uns tempos atrás, meu pai viu-se na ingrata situação de ter de dispensar o Senhor Moreira do serviço.
Não somente ele era vizinho da frente como era pessoa muito cordial e por quem meu pai tinha a maior das estimas.
O respeito e a consideração mútua nunca foram abaladas.
O atingido sentiu-se magoado, mas nunca mostrou qualquer rancor. Por outro lado, meu pai conservou por ele o apreço de sempre.
Poucos anos mais tarde, o Senhor Moreira deu sinal de grande sensibilidade para com aquele vizinho, que tomara a difícil decisão.
O caso foi muito comentado no meio e as pessoas tendiam a tomar posição.
Uns defendiam que meu pai não dispunha de outra alternativa. Outros entendiam que aquela atitude poderia ter sido evitada.
Curiosamente, meu avô considerava que poderia ter sido decidido de outra forma. Demonstrava o seu carácter conciliatório e moderado.
Geraram-se mesmo acesas discussões.
Foi num desses debates que veio a morrer um grande amigo do Senhor Moreira.
Certo indivíduo argumentava fortemente a favor da decisão tomada. Para isso, recorrera – decerto escusadamente - à crítica feroz dirigida ao visado pela resolução.
Foi demais para o amigo do Senhor Moreira.
Ele não aguentou ouvir aquilo.
Foi acometido de uma síncope.
Aquele vizinho de meus pais é uma pessoa distinta e de uma classe inultrapassável.
Quando eu conclui o meu curso de Direito, ele cumprimentou-me efusivamente, umas quantas vezes, na rua. Fazia-o de viva voz, chamando por mim, de um lado para o outro da rua:
- Bom Dia, Senhor Doutor! Como vai, Senhor Doutor?
À terceira vez que isso sucedeu, eu acerquei-me dele e protestei:
- Mas, Senhor Moreira, eu peço-lhe que não me trate desse modo. O Senhor conhece-me desde que eu nasci.
Ele agarrou-me no braço e contou-me:
- Sabes, eu faço de propósito. Mas é só quando tu estás à distância. Assim, toda a gente fica a saber que já és formado.