quarta-feira

REGALIAS


Na sequência da minha crónica sobre “regalias” dos presos, recebi vários comentários simpáticos e muito esclarecedores. Aprendi muito com os mesmos.
Muitos reclusos utilizam telemóveis, recorrem a prostitutas, consomem drogas e ingerem bebidas alcoólicas.
Tudo isso é contrário ao espírito da privação da liberdade, como sanção pela prática de um crime.
Desde logo, a prisão não é um hotel.
Depois, importa analisar o que pretende um juiz quando envia um homem para a cadeia.
Segundo uma visão clássica, a prisão deve corresponder a um castigo. Actualmente, continua a ser assim, mesmo para quem não queira ser demasiado fariseu.
É a punição, é a sanção pelo facto de um criminoso ter violado a lei.
Mas, actualmente, acrescenta-se um outro elemento.
Esse castigo deve proporcionar ao criminoso que repense a sua vida e a encaminhe no sentido de passar a cumprir a lei.
Ou seja, a punição deve levar à reinserção social ou ressocialização.
Por isso, não basta uma mera privação da liberdade. Importa também motivar e criar meios que facilitem o abandono da criminalidade.
Deste modo, a lei diz que as principais finalidades da prisão são:
- combater o crime
- reintegrar o criminoso na sociedade.
Ora não é certamente com vinho, telemóveis, drogas e prostitutas que se evita o crime e se afasta um criminoso da marginalidade.
Vejamos o que há a dizer sobre algumas destas realidades.


ABSTINÊNCIA

Em primeiro lugar, algumas palavras sobre estupefacientes.
Algumas pessoas imponderadas, menos instruídas e mais desconhecedoras do meio prisional afirmam que o uso de drogas pelos presos permite manter uma certa paz e facilita o trabalho dos guardas prisionais.
Evidentemente, quem toma heroína fica encostado a um canto, tem poucas forças e sente-se satisfeito. Por outro lado, quando um toxicodependente se encontra em abstinência, fica agitado e pode tornar-se violento, assumindo o comportamento de quem está a ressacar, segundo a gíria.
No entanto, dizer que a utilização das drogas pelos reclusos é um mal necessário, mantém a paz e facilita o trabalho:
- carece de qualquer base científica
- é totalmente insensato.
Qualquer pessoa de bom-senso percebe que tal não é solução. A droga destrói qualquer possibilidade de um preso se reinserir socialmente, ressocializar-se e regenerar-se.
A introdução de estupefacientes nunca poderia ser tolerada e deve ser fortemente prevenida. A droga deve ser combatida nas prisões, a todo o custo.
A troca de seringas constitui diferente problemática.
Acima de tudo, é uma questão de princípio. Traduz uma admissão implícita de que existe consumo de estupefacientes. Não fomenta a utilização de droga. Só por si, a oferta de uma nova seringa em troca de uma usada, não permite que um recluso consuma estupefacientes.
Todavia, a troca de seringas satisfaz duas necessidades prementes:
- prevenção em matéria de saúde pública
- evita o estabelecimento de poderes ilegítimos e relações de força em torno da comercialização e cedência de acessórios para consumo de droga.


TELEFONES

Em matéria de telefonemas, quero fazer um esclarecimento prévio.
Eu defendo a manutenção da situação actual:
- Os reclusos não devem ter acesso a telemóvel
- Deve haver cabines telefónicas para utilização pelos presos.
Quem quiser mudar o estado de coisas (permitir os telemóveis ou acabar com as cabines), escusa de continuar a ler.
Por que motivo existem telemóveis clandestinos nos estabelecimentos prisionais? Por quatro razões:
1. Pode-se telefonar para qualquer número (nas cabines, só é permitido ligar para certos números constantes de uma lista que o recluso elabora e que é aprovada)
2. Conversa-se em absoluta privacidade
3. É moroso e complicado fazer telefonemas nas cabines, onde existem longas bichas e onde são frequentes os desacatos
4. É facílimo introduzir telemóveis na cadeia e mantê-los.
Para prevenir os telemóveis, há que combater estes factores.
Actualmente, não faz sentido limitar os telefonemas apenas para alguns números. Aliás, constitui um dispêndio de recursos colocar um funcionário a verificar as listas de chamadas e confirmar se o preso telefonou para um número não autorizado.
Através da cabine, o recluso fala com quem quiser. Se ligar para um número de telemóvel autorizado, basta que o destinatário tenha em seu poder o equipamento ou apenas o cartão SIM (Subscriber Identity Module) inserido no seu telemóvel. Caso ligue para um número de rede fixa, basta que haja reencaminhamento para outro número.
Portanto, não vale a pena restringir as chamadas a certos números de telefone.
A utilização das cabines telefónicas deve ser facilitada. Maior número de cabines não implica custos. Até reduz a utilização de recursos, na medida em que evita distúrbios e permite rentabilizar os horários dos telefonemas, possibilitando nalguns casos a redução de tal período.