Quando eu ainda era casado, fui com a Mãe das minhas filhas ao ortopedista. Rapidamente, o clínico comunicou o diagnóstico associado às intensas dores no pé direito dela:
- Trata-se da síndroma de Morton.A nós pareceu-nos ouvir “Morta” e ficámos algo alarmados.
A linguagem científica e técnica tem destas coisas. Nós, leigos, tendemos a associar um vocábulo estranho a uma palavra que conhecemos.
No mundo das leis, o mesmo se passa.
José Castelo Branco acaba de publicar um interessante livro biográfico, redigido em parceria com Ricardo Santos: “Toda a Verdade”.
Aí recorda o incidente ocorrido no aeroporto de Lisboa, em 2003. O marchand vai e vem de Nova Iorque, inúmeras vezes. Um dos regressos a Portugal foi particularmente tumultuoso. Conjuntamente com sua mulher, o marchand tinha participado num programa de Herman José, onde o casal havia exibido algumas jóias.
Pouco tempo depois, ao vir da cidade norte-americana, após aterrar na Portela, José foi mandado parar na alfândega. Assumiu a propriedade de todas as malas e do seu conteúdo. Tendo sido localizadas várias peças de joalharia, ficou detido.
É bem divertida a forma como o socialite conta o que se passou.
Ele iria ser interrogado no Departamento de Acção e Investigação Penal, conhecido por DIAP. É assim que José Castelo Branco relata os acontecimentos:
- A polícia informou que me iria levar para o DIAP, pensei que me estavam a mandar para o Diabo, não fazia ideia do que era.
FACTURAS FALSAS
Certa vez, eu procedia ao julgamento de um indivíduo acusado de emitir facturas falsas. Ele encontrava-se em liberdade, mas vim a condená-lo a prisão efectiva. Antes de proferir a minha sentença, quis apurar alguns dados sobre o arguido. A lei era diferente da actual e o próprio sistema informático ainda não permitia aceder a todos os elementos respeitantes a processos judiciais noutros tribunais.
No entanto, eu achei estranho que aquele arguido não tivesse em seu poder um bilhete de identidade actualizado. Apenas exibira a fotocópia de um documento cuja validade se encontrava expirada.
A situação fazia-me supor que, noutras localidades, correriam processos criminais contra o mesmo sujeito.
Mas, caso ele andasse a furtar-se à justiça e não tivesse sido localizado, os meus Colegas Juízes poderiam tê-lo declarado contumaz. Tendo-se ele recusado a comparecer a juízo e desconhecendo-se o seu paradeiro, seria aplicado o regime da contumácia.
Nesses casos, as mais diversas repartições públicas recebem uma comunicação do Juiz. As autoridades ficam impedidas de satisfazer qualquer pedido daquele arguido. Torna-se inviável renovar o cartão de cidadão, obter um passaporte, comprar ou vender um imóvel ou receber uma simples certidão. É a chamada morte civil.
Normalmente, o acusado toma conhecimento de que está sujeito à contumácia, quando requer a substituição do bilhete de identidade. O documento fica logo apreendido. Depois, não é emitido o cartão de cidadão, até que o arguido compareça no tribunal.
Era o que eu suspeitava, relativamente àquele figurão, cuja única actividade era dedicar-se a negociar facturas falsas. Num tribunal algarvio, havia um processo contra ele, por factos idênticos. Mas ele nunca se dignara a apresentar-se, em conformidade com as respectivas convocatórias.
Por isso, eu questionei-o:
- Explique-me lá por que razão não tem o bilhete de identidade e não foi renová-lo.
A resposta foi sincera. Ia de encontro ao que eu previa. Realmente, ele tinha sido declarado contumaz. Estava sujeito à contumácia. A forma de ele se exprimir é que foi peculiar:
- Senhor Dr. Juiz, eu estou com a Tomásia.