Jaime Neves, recentemente falecido, destacou-se no
período revolucionário, como importante elemento que continha os mais agitados.
Militar e politicamente, a sua intervenção revelou-se
decisiva no dia 25 de novembro de 1975. Liderando o regimento de comandos,
tomou o quartel da Ajuda e conseguiu a rendição das chefias da Polícia Militar.
Jaime Neves também deu o seu contributo para a justiça.
Por duas vezes, deslocou-se com os seus homens da
Amadora até à cadeia do Linhó, em Sintra.
Ambos os episódios ocorreram ainda em 1974, pouco
depois do derrube do regime.
A dada altura, uns elementos da GNR impediam que fosse
hasteada a bandeira portuguesa naquele estabelecimento prisional.
Neves tinha fama de resolver sempre as insurreições,
nunca deixando que os rebeldes levassem a sua avante. Esta reputação já lhe
permitia impor a sua vontade sem grande esforço. Todos sabiam que não valia a
pena contrariar o tenente-coronel.
Pois naquele dia em que a bandeira não fora içada na
prisão, bastou ao comandante aproximar-se do estabelecimento prisional, com uma
coluna militar. Jaime Neves foi o único que se apeou. Posicionou-se junto ao
portão. A bandeira nacional foi prontamente hasteada, sem necessidade de dizer
uma palavra.
OS DO LIMOEIRO
Uns meses mais tarde, surgiu um problema deveras
complicado.
Em Lisboa, a cadeia do Limoeiro albergava os condenados
a pena maior, em condições verdadeiramente infames, impróprias de um Estado que
pretendia implementar uma democracia, com respeito pelos direitos do Homem. O
único remédio era mesmo encerrar a prisão, onde posteriormente veio a ser
instalado o centro de estudos judiciários, a escola de formação dos juízes.
Mas não foi a solução ideal. Os criminosos foram
transferidos para o Linhó, onde se encontravam reclusos primários, que nunca
tinham sofrido sanções anteriormente, quase todos jovens a cumprir penas
correcionais, de curta duração.
Recém-chegados, os catedráticos da delinquência, vindos
do Limoeiro, não pouparam os rapazes encarcerados em Sintra. Cada um dos
cadastrados escolheu um recluso, para seu impedido, que, em muitos casos, era
também um escravo sexual. Experientes nas lides prisionais, os reincidentes
facilmente lideraram a população reclusa, que consideravam demasiado passiva.
Não tardou a que convencessem todos a organizar um
motim, ali na prisão do Linhó. Era relativamente fácil, visto que o número de
presos aumentara substancialmente.
De um dia para o outro, os guardas prisionais foram
dominados pelos prisioneiros, que tomaram as rédeas da cadeia.
Lembrados do que se passara anteriormente com a recusa
em hastear a bandeira portuguesa, os responsáveis acharam que o melhor era
requisitar, novamente, a intervenção dos Comandos.
A situação era explosiva e previa-se uma ação violenta,
para conter a revolta.
Ao que consta, tudo decorreu da forma mais pacífica
possível.
Jaime Neves dirigiu-se ao refeitório e mandou chamar os
líderes dos amotinados. De pé, em cima de uma mesa, discursou. Sem uso da
força, todos os presos recolheram às suas celas, que foram trancadas pelos
guardas. A cena ficou na história dos serviços prisionais portugueses.
Estas duas vitórias, pequenas, mas significativas, são
relatadas na excelente biografia redigida por Rui de Azevedo Teixeira: "Jaime Neves, Homem de Guerra e Boémio".
A obra menciona também a vida noturna do militar, muito
intensa até ao seu casamento. O enlace ocorreu precisamente em 1976, ano em que
terminou o período revolucionário e as instituições democráticas começaram a
funcionar em normalidade.
Jaime Neves passeava-se pelas ruas da capital, ao
volante do Mercedes preto, que antes estivera ao serviço de Henrique Tenreiro,
entretanto exilado no Brasil.
Passava pelos nightclubs, com as companhias mais
diversificadas. Frequentemente, estoirava dinheiro num casino ilegal, instalado
na Avenida da Roma e pertencente a um célebre juiz.