Atualmente, não deve haver muitos militantes do PCP que
se revejam na mítica frase de Álvaro Cunhal que anunciava “a superioridade moral dos comunistas”. Era uma afirmação arrogante
e desrespeitadora para quem assume posições ideológicas diferentes, como é o
meu caso.
Mas a verdade é que o partido deve continuar a
orgulhar-se de não existirem muitos casos graves de desonestidade entre os seus
camaradas.
Carlos Sousa era presidente da câmara de Setúbal quando
se descobriu o indecente esquema das aposentações compulsivas. Funcionários ainda
novos em idade conseguiam a reforma antecipada, com um simples processo
disciplinar. Os beneficiados iam trabalhar para outro lado e acumulavam duas
fontes de rendimento. Pessoalmente, eu sei que isso é cómodo, embora não tenha realizado
nenhum esforço ou elaborado um plano voluntário em tal sentido.
O PCP comunicou que tinha feito uma avaliação ao
trabalho daquele autarca sadino e convidou-o a demitir-se do cargo. Agradeceu-lhe
os serviços prestados e uma vereadora da mesma agremiação política passou a
liderar o município.
De resto, não me lembro de muitas outras situações
embaraçosas.
De um momento para o outro, o chefe máximo do concelho de
Vendas Novas fugiu rumo a África. Porém, foi acompanhado da secretária e amante,
por tal sinal casada com o chefe de pessoal da edilidade. A única razão do desaparecimento
foi mesmo o affaire. Nada a
censurar quanto ao desempenho político do marxista.
POLITBURO
Carlos Carvalhas foi secretário-geral da organização, durante
uma dúzia de anos.
O economista apresentava uma excelente situação
económica, fruto do seu trabalho na Profabril e das poupanças familiares, em
particular de seu Pai, sendo dono de um considerável património imobiliário bem
gerido.
Não obstante, durante o seu mandato, sempre levou uma
vida austera.
Constatei-o logo em 1992, ano em que ele passou a
liderar o PCP.
O meu primo José Fráguas Lucas tinha morrido. Era homem
abastado. Sempre financiou aquele partido, no qual militava convictamente,
procedendo a generosos e desinteressados donativos frequentes, antes e após o
25 de abril.
De modo que, no velório, o comité central lá se fez
representar, incluindo Carlos Carvalhas e Domingos Abrantes, com outros três
membros cuja identidade não recordo.
Traziam uma bandeira do partido, que foi colocada no
caixão, sobre o féretro.
Os cinco dirigentes chegaram todos na mesma viatura, um
modesto Renault Clio. Deixavam claro que não estavam na política com fausto ou
ignomínia.
HORTICULTURA
Uns meses depois é que ocorreu um episódio mesmo desagradável
para Carlos Carvalhas, reconhecidamente impoluto e muito digno.
Foi vítima de um aborrecido equívoco quando se
encontrava tranquilamente às compras no AKI, grande superfície dedicada à
bricolage.
Tendo finalizado as aquisições, dirigiu-se à caixa e procedeu
ao pagamento.
Um vigilante excessivamente zeloso colocou-se à sua
frente e pediu-lhe satisfações quanto a uma tesoura de podar que o parlamentar
tinha no bolso, aliás de forma bem visível, porque uma das alavancas se
encontrava fora da algibeira.
Passara-se o seguinte.
Enquanto circulava com o carrinho, o cliente foi retirando
os artigos escolhidos. Ao optar por aquele instrumento de jardinagem, cometeu
uma distração instintiva. Em vez de a colocar juntamente com os outros objetos,
meteu a tesoura no casaco, como se estivesse no quintal, a tratar das plantas.
A situação era óbvia. O segurança deveria ter
discretamente alertado o freguês ou, quando muito, a colega da caixa.
Evidentemente, o deputado pagou o instrumento, tendo o
responsável da loja apresentado as suas desculpas pelo desnecessário incómodo.