quinta-feira

ATRACÇÃO FATAL




Na semana passada, referi que ao longo dos julgamentos vou aprendendo as coisas mais insólitas.
Algumas não lembram ao diabo. Outras são já conhecidas de muita gente, mas eu só venho a descobrir em pleno tribunal.
Entre as realidades mais divulgadas e cuja existência eu ignorava até há pouco tempo está um aparelho fabricado em Espanha. É utilizado por caçadores para atraírem tordos.
Trata-se de uma actividade venatória relativamente simples. Daí a tristemente célebre expressão aplicada por vezes aos automobilistas portugueses que aceleram em certas estradas perigosas: “morrem que nem tordos”.
Legalmente, esta ave só pode ser capturada até às quatro da tarde. Havia uma velha desculpa dada no final do dia:
- Senhor guarda florestal, estes tordos que eu tenho aqui no cinto foram caçados antes das quatro.



GUARDAR AS PEÇAS

Actualmente, por lei, todo o caçador tem de ir colocar as peças na sua viatura até às 16h00m impreterivelmente. Não pode andar com elas no cinto.
Ora até às quatro horas é um ver se te avias. Convém apanhar o máximo de pássaros.
Dizem que assobiar dá resultado. Chama os tordos. Mas também deve ser um pouco cansativo estar constantemente a assobiar. Torna-se monótono, a boca fica seca e a pessoa pode ter o receio de ser considerado anormal.
De modo que na arrecadação de algumas casas da especialidade há uns dispositivos que só se vendem a clientes habituais.
São os chamarizes electrónicos a pilhas. Vêm do país vizinho. Custam cerca de vinte e cinco euros.
É um aparelho de dimensões relativamente reduzidas. O caçador coloca-o nas proximidades do seu ponto de actuação. Acciona-o e começa a ser emitido um zumbido. Os tordos são atraídos de um modo impressionante. É só vê-los chegar.
Claro que os guardas florestais não são ineptos. Têm olhos e ouvidos. Vêm uma quantidade de aves na mesma direcção. Umas quantas são abatidas. Depois, aproximam-se do local onde elas caem. Pela audição, apercebem-se onde se encontra o chamariz.
Nesse momento, os agentes têm de actuar com muita sensatez.
Seria totalmente errado abordar de imediato o infractor e apreender o equipamento. É que ele diria logo: “sim, eu estou à caça de tordos. Mas não tenho nada que ver com esse dispositivo que os senhores encontraram. Não me pertence. Não fui eu que o coloquei aí”.
Os guardas têm de ser pacientes.
O melhor é permanecerem ocultos. Vão observando discretamente o caçador. Quando ele for recolher o aparelho, detêm-no em flagrante.
Tem de haver a máxima reserva. Se o homem se aperceber da presença dos guardas, vai-se embora e deixa lá a máquina. Perde vinte e cinco euros, mas não é punido.
É que constitui crime utilizar este tipo de dispositivo. O transgressor sujeita-se a seis meses de prisão.
Para finalizar, deixo uma nota de gratidão.


AVIÃO

Quero agradecer as amáveis referências que me têm chegado relativas ao livro que acabo de publicar. Sem desprimor para ninguém, há uma que elejo como a mais divertida. Não sei se a devo tomar como elogio ou como subtil ironia.
Um amigo meu fez uma breve deslocação profissional à Guiné Bissau. Teve a amabilidade de levar consigo a obra.
Durante a estadia, ficou muito indisposto com uma incómoda diarreia. Tinha de ir constantemente às instalações sanitárias, onde passava longos momentos.
Simpaticamente, disse-me que o que lhe valeu foi o livro de minha autoria. A leitura deixava-o mais bem humorado.Só espero que houvesse papel higiénico em quantidade suficiente...