Despertou-me curiosidade um recente acórdão que pôs termo a uma batalha jurídica de quatro anos em torno de um acidente ocorrido perto da cidade-berço. Referir-me-ei ao caso posteriormente. Não tenho nele nenhum interesse profissional ou pessoal.
Queria agora apenas contar como se legitima o estudo e
a análise de sentenças.
É longa a prática de tornar conhecidos os arestos do
Supremo Tribunal de Justiça, fazendo-se uma seleção, para inserção de alguns no
extinto Boletim do Ministério da Justiça e noutras publicações.
Deve até ser ampliada a difusão.
Justifica-se que, sem exceção, todas as decisões sejam
tornadas públicas, como sucede com o Tribunal Constitucional. Havendo uma base
de dados na Internet, não há motivo para triagem, devendo nesse arquivo digital
constar a totalidade das deliberações.
O Supremo é a catedral do sistema judicial português.
Aí desempenham funções 58 juízes-conselheiros, a que
acrescem quatro militares. São magistrados no topo da carreira ou juristas de
reconhecido mérito a quem cumpre proferir a derradeira resolução que esgota
todos os recursos admissíveis, encerrando definitivamente o caso. Somente em
caso de inconstitucionalidade de uma norma, é ainda possível fazer intervir o
órgão judicial que fiscaliza o cumprimento da lei fundamental.
FAMA
Uma higiénica tradição encetada pela saudosa Revista de
Legislação e Jurisprudência autoriza a apreciação crítica destes acórdãos.
Trata-se de discutir os vários argumentos que abonam cada uma das orientações
possíveis e depois tomar posição, concordando ou divergindo da deliberação
tomada no aresto.
Foi nesse âmbito que Antunes Varela censurou
veementemente determinada sentença que deu razão a um oculista.
O homem mantinha relações sexuais com a amante em pleno
estabelecimento comercial, embora só destinasse a loja a essa finalidade
durante os fins-de-semana, com a porta encerrada ao público. O senhorio
aproveitou aquele pretexto para intentar um processo de despejo, mas perdeu a
ação.
Também nesse quadro tornou-se famosa a medida que
suspendeu das suas funções um juiz madeirense que se embriagava num bar de
homossexuais. Foi há 35 anos e seria dificilmente concebível nos dias de hoje.
Tal como se celebrizou a “coutada do macho ibérico”.
Em 1989, Vasco Tinoco batizou assim o Algarve.
O juiz pretendia explicar a duas turistas estrangeiras
o perigo de pedir boleia em Almancil. As jovens acabaram sequestradas por um
homem de 21 anos e outro com 18. Uma das vítimas foi violada pelo mais velho, que
apanhou 4 anos de prisão.
A branda sanção justificava-se da seguinte forma: “a
atração pelo sexo oposto é um dado indesmentível e, por vezes, não é fácil
dominá-la”. Além de que a
rapariga, a dada altura, deixou de oferecer resistência, havendo a salientar “a forma e o ardor viril com que o seu
violador copulou”.