quinta-feira
AGRESSÕES FÍSICAS E VERBAIS
É possível dar uma tareia a uma pessoa e ficar impune?
Sim. Mas se for no Parlamento de Taiwan, a ilha Formosa. Entre deputados, claro está. O vocábulo parlamento deriva do francês parler (falar). Mas naquele país os debates da Assembleia vão muito para além do diálogo mais aceso.
Houve alguns tempos de acalmia, mas de vez em quando lá regressam as cenas de pancadaria.
Nas décadas de oitenta e noventa, eram vulgaríssimas.
A explicação era simples.
Existia um conjunto de deputados já idosos, que pouco intervinham, mas mantinham os respectivos privilégios. Compareciam às sessões, sem desempenharem papel de relevo. Eram pessoas que tinham sido eleitas na China, antes da revolução comunista de 1949. As autoridades de Taiwan sempre consideraram que simbolizavam a verdadeira China. Portanto, esses indivíduos eram os membros do Parlamento que representavam cada uma das regiões. Tinham o direito de manter o seu cargo.
Entretanto, iam sendo designados novos deputados, de uma geração mais recente. Muitos deles não pactuavam com aquela situação e punham em causa a legitimidade de pessoas eleitas há décadas atrás. O único modo de os afastar era conduzi-los à demissão. Surgiram as cenas de murro e pontapé. Muitas vezes com feridos. Mas também com alguns sorrisos irónicos à mistura. Os mais velhos tinham pouca paciência para aquelas coisas e foram-se retirando. No entanto, permaneceu a tradição, embora com menor intensidade.
PERDER AS ESTRIBEIRAS
Como é diferente a realidade em Portugal...
Há dias, a deputada Odete Santos interrompia constantemente outros colegas. O Presidente da Assembleia elevou o tom de voz e disse-lhe que ela deveria manter-se em silêncio. A parlamentar apresentou desculpas. Mota Amaral esclareceu que era ele que deveria pedir desculpa, pois perdera as estribeiras.
A questão das agressões verbais é muito delicada.
Nem sempre a decisão é fácil.
Um homem afixou um papel na janela do rés-do-chão da sua casa. Chamava porca a uma senhora. Ela apresentou queixa-crime. Para o juiz, é complicado dar a sentença.
CASTELO
O que vou contar de seguida passou-se com três pessoas ilustres. Todas elas já falecidas.
O sesimbrense Rafael Monteiro era um escritor muito conceituado. A Câmara de Sesimbra tem vindo a publicar a sua obra.
O grande José Cardoso Pires gostaria de saber algo mais sobre o solitário do castelo de Sesimbra. Agostinho da Silva disse-lhe que o maior especialista sobre a matéria era precisamente Rafael Monteiro. Mas este, por vezes, era um pouco dado a confrontos. Quando recebeu a visita do escritor, nem sequer possibilitou a entrada em sua casa. Perguntou o sesimbrense, como se tentasse recordar-se de quem seria aquela figura pública:
- Deixe ver se me lembro. O senhor não escreveu uma autobiografia?
- Não, nunca escrevi nenhuma autobiografia.
- Ora essa! Então não foi o senhor que escreveu Eu, Burro de Pé?
Realmente, José Cardoso Pires é autor de um conto com aquele título. Rafael Monteiro não perdeu a oportunidade para introduzir a sua ironia.