quarta-feira
NO DIA DO JULGAMENTO
Apreciei muito a leitura da obra “Amo-te Filha! O Caso Esmeralda, Sargento Luís Gomes – A Verdadeira História”. Escrito pela jornalista Patrícia Silva, trata-se de um livro bem redigido e de leitura muito agradável.
O prefácio de Manuela Ramalho Eanes é das partes mais sensatas e interessantes.
Recomendo vivamente a leitura deste livro.
Dito isto, importa ter em consideração três factores.
O tempo em que vivemos não é o da Roma Antiga.
Nessa época, um bebé nascia e era encarado como uma mera manifestação biológica, sem direitos. Pouco importava quem o havia concebido e de que ventre materno havia saído.
Pai era aquele que decidia exercer o poder paternal sobre a criança. Amava-o, providenciava pela sua subsistência, educava-o e esperava dele a lealdade que um descendente deve a seus progenitores.
É conhecida a frase de espanto, proferida por Júlio César, ao verificar quem se encontrava entre os traidores que o iriam assassinar:
- Tu também, Brutus, meu filho?
Na realidade, Brutus apenas tinha sido adoptado como filho pelo Imperador.
Actualmente, não é assim. Adoptar é uma solução de recurso, que é indesejável, em regra. Apenas deve ser considerada quando a vinculação à família biológica é impossível.
Em segundo lugar, este livro apresenta uma versão. Neste caso, de uma parte interessada: o homem que, em conjunto com a sua mulher, cuidou de uma criança quase desde o seu nascimento, tratando-a como se sua filha fosse, tendo sempre em vista vir a adoptá-la. Trata-se, portanto, de uma visão apaixonada, como o próprio título denuncia.
Finalmente, como já afirmei, é uma obra de leitura acessível, muito cativante e certamente destinada a seduzir o leitor.
Em grande medida, trata-se de um texto de ficção. Baseado numa certa interpretação de factos reais, mas incluindo sempre a sua componente de fantasia.
No livro, alude-se, obviamente, ao julgamento no Tribunal de Torres Novas.
Diz-se: “quando um militar é chamado para ir a tribunal tem de se apresentar, obrigatoriamente, uniformizado”.
Tal é falso. Seja arguido ou testemunha, o militar vai para a sala de audiências como lhe apetecer. Nesse aspecto, há total liberdade. Nem a instituição castrense o força a ir fardado. Nem o Juiz o obriga a tal.
Aliás, é raro os militares apresentarem-se uniformizados.
Relata-se que, no primeiro dia do julgamento, em breve chegou a hora do almoço. O Juiz anunciou o intervalo mediante “dois toques com o martelo de madeira na mesa”.
Em Portugal, os juízes não utilizam martelos. Apenas os usamos na marisqueira, quando descascamos sapateira.
Luís Gomes, o arguido, permanecia sentado na sua “cadeira de réu”. Não se trata propriamente de uma cadeira, mas de um banco corrido.
Decretada a prisão preventiva, conta-se que o sargento foi encaminhado para o Presídio de Tomar.
Explica-se que o arguido foi conduzido num escuro carro celular. Ignoro se é verdade. Mas é altamente improvável. Em princípio, terá sido transportado num vulgar automóvel policial. Somente após o recluso dar entrada no estabelecimento prisional, é que as conduções posteriores são realizadas nesse tipo de carrinhas.