Em Novembro de 2007, no Terreiro do Paço, uma condutora atropelou três mulheres. Duas morreram e outra ficou com sequelas graves para sempre.
A responsável pelo acidente foi agora condenada a três anos de prisão efectiva. Psicóloga de formação, ela seguia a mais de 110 km/h, no momento da tragédia.
De um modo geral, a comunicação social fez abordagens muito correctas.
Com algumas excepções, claro. No dia 8 de Abril, um jornal noticiava que “todas as outras condenações a prisão efectiva já aplicadas em caso de atropelamento tinham sido por homicídios qualificados”. Tal é completamente falso. Pura invenção do jornalista.
Algumas questões podem ser explicadas.
Em primeiro lugar, os familiares das pessoas mortas têm direito a ser indemnizados. Idêntica compensação é devida à infeliz vítima que sobreviveu. Estes pagamentos são efectuados pela companhia de seguros.
Os condutores não são responsáveis pelas indemnizações. Em certos casos, a seguradora paga uma quantia que é aceite pelas vítimas. Quando não há acordo, o juiz fixa o respectivo montante e condena a companhia a satisfazer o devido.
O CASTIGO
Havendo mortos ou feridos, a pessoa que seguia ao volante é punida com uma sanção criminal.
Quando alguém conduz em excesso de velocidade, um certo raciocínio desenvolve-se na sua mente. Admite que poderá atropelar um peão. Considera até possível que a vítima perca a vida. No entanto, confia que isso não acontecerá. Embora coloque tal hipótese, convence-se de que a mesma não se verificará. Por isso, diz-se que age em negligência consciente.
Em casos mais raros, até poderá suceder que o condutor nem sequer chegue a pensar em semelhantes possibilidades. Não será normal. Todos nós, quando nos colocamos ao volante do nosso carro, sabemos que um acidente poderá ocorrer. Então se violarmos as regras, ainda mais cientes estaremos disso. De qualquer modo, se a pessoa for tão irresponsável que nem medite naquelas suposições, agirá com culpa inconsciente. É penalizado, na mesma.
Vejamos agora como a mencionada arguida foi condenada a três anos de prisão.
O colectivo de juízes declarou-a autora de três crimes. Dois foram de homicídio. Por cada um deles, foi determinada uma sanção de dois anos. A terceira infracção foi a de ofensa à integridade física, sendo a punição de um ano. A soma aritmética resulta em cinco anos. O cúmulo jurídico originou uma pena única de três anos, a cumprir em real privação da liberdade.
Esta orientação é relativamente recente. Antigamente, sempre que havia mais do que um morto num acidente, o juiz considerava que apenas um crime havia sido cometido.
A lei não mudou. Mas, actualmente, muitos juízes decidem que há tantos crimes quantas as vítimas do desastre.
Pessoalmente, eu não adopto este entendimento. Nunca condenei ninguém por vários crimes, mesmo havendo diversos mortos. Apliquei sempre somente uma pena. Julgo que a lei vai nesse sentido.
Evidentemente, valorizo o facto de diversas pessoas terem perdido a vida. Mas tal deve ser levado em consideração para condenar o arguido a uma pena mais pesada. O resultado é mais sério. A sanção será mais grave. É o que se designa por um maior grau de ilicitude, ou seja, uma violação mais intensa da lei.
Neste dramático caso, certamente a arguida irá interpor recurso. O Tribunal da Relação de Lisboa irá reapreciar a matéria. O tema central será com certeza este. Decidir-se-á se houve um ou três crimes.