Já tenho mencionado a expressão “mal por mal, antes a
prisão do que o hospital”.
O Pedro completou 40 anos no pior local. Trata-se de uma
unidade hospitalar, mas simultaneamente uma cadeia.
Ele encontra-se no hospital prisional São João de Deus,
em Caxias. Ainda por cima, está em coma vegetativo. Muito provavelmente, não se
apercebe de nada do que se passa em seu redor.
Obviamente, não é boa rês. Mas ninguém merece sofrer um
acidente vascular cerebral e ficar naquele estado do qual dificilmente sairá.
Aqui há uns tempos, ele dedicava-se a cobranças
difíceis. Reuniu-se a um grupo de indivíduos que ofereciam os seus serviços a
quem tinha dificuldade em obter pagamentos. Por exemplo, se alguém se queixava
que uma pessoa lhe devia quatro mil euros, lá ia ele tratar de recuperar o
crédito. Apertava com o caloteiro até que ele entregasse o dinheiro todo.
Depois, dizia ao cliente que o outro apenas tinha conseguido arranjar metade.
Aí estavam dois mil euros. Sempre era melhor do que nada. O Pedro metia ao bolso a
outra parte e ainda recebia uma comissão sobre a quantia entregue ao credor.
É claro que isto não ia terminar de modo satisfatório.
Certa vez, pressionou demasiado um devedor. No meio das agressões, este sofreu
uma mutilação genital e, logo no hospital, apresentou queixa.
O Pedro, cobrador, e o seu cliente, credor, foram para
a prisão. No entanto, mal por mal… antes aí do que no centro hospitalar para
onde foi mandado o homem privado do seu órgão sexual.
Após ter cumprido a pena, o Pedro não se corrigiu.
Apenas mudou de ramo, mantendo-se na marginalidade. Passou a traficar droga. O
dinheiro entrava e ele investiu num café. Era mais do que um modo de lavar o
capital. O negócio até dava lucro.
CURADOR
Mas ele só parou de traficar quando foi novamente
preso.
Condenado, passou a trabalhar no local mais indicado
para ele, no estabelecimento prisional. Precisamente no bar da cadeia.
Pouco faltava para atingir metade do tempo a que fora
sentenciado. Poderia requerer a concessão de liberdade condicional.
Sem que nada o fizesse prever, enquanto andava de roda
da máquina do café, caiu redondo no chão. Chamado o enfermeiro de serviço,
foram-lhe prestados os primeiros socorros até chegarem as viaturas da
emergência médica.
No hospital-prisão, duas datas marcantes foram assinaladas.
A passagem do seu quadragésimo aniversário, como relatei. Mas também o dia em
que atingiu o cumprimento de metade da sua pena de prisão.
Teoricamente, estão reunidos os pressupostos para que o
juiz de execução de penas o coloque em liberdade condicional.
No estado em que está, não é previsível que o Pedro
venha a cometer novos crimes. Por outro lado, parece assegurada a paz social.
Quem se incomoda que seja posto termo à privação da liberdade?
Mas há outro requisito essencial. É necessário que o
criminoso consinta na liberdade condicional.
Aparentemente inconsciente e incapaz de manifestar a
sua vontade, a única possibilidade é nomear-lhe um curador. Não daqueles que
curam doenças. Está em causa uma situação que ultrapassa as capacidades da
medicina. Apenas uma daquelas pessoas de família, que o magistrado designa como
curador provisório, nos termos do Código Civil.