Estive com ele apenas numa ocasião. Aquando de uma grandiosa festa de
aniversário do jornal “Sol”, que teve
lugar no Instituto Superior de Agronomia, em ambiente encantador.
Com imenso agrado, leio as suas crónicas, análises e
livros.
Refiro-me a José António Saraiva.
Aprecei especialmente o artigo desta semana, na
publicação que ele dirige.
Genuinamente, mostra-se muito surpreendido com
realidades que a mim não me espantam nada. Contudo, isso é deformação
profissional de quem tem lidado com centenas de processos de sinistros
automóveis.
O arquiteto relata um pasmo inicial.
Foi quando verificou que o seu carro, devidamente
arrumado num parque de estacionamento, havia sido embatido por outra viatura, tendo
a condutora deixado o veículo ali mesmo, ainda encostado ao danificado pela
colisão. Ou seja, ela não se apercebeu do choque e foi à sua vida.
DISTRAÇÃO
Nada que me admire.
É vulgaríssimo que um automobilista esteja distraído ao
parquear o carro.
A velocidade é reduzidíssima, não haverá interação com
outros condutores e a atenção pode ser desviada para diversos assuntos. Talvez
se esteja a falar ao telemóvel. Porventura, olha-se para a telefonia ou para o
GPS. Há quem vá retirando o cinto de segurança, abra o porta-luvas ou guarde o
talão emitido pela máquina junto à cancela.
Eventualmente, algum atraso pode preocupar-nos ou estaremos
ansiosos devido a uma reunião que nos leva àquele local.
Por isso mesmo, há quem se esqueça de trancar as portas.
Até pode deixar o motor a trabalhar. Conheço três casos
desses.
Um ocorreu no hospital São Francisco Xavier, com um futuro
pai desassossegado, cuja mulher iria dar à luz.
Outro com uma advogada que levou com ela a chave do
automóvel e trancou as portas. Naquele modelo de luxo, o motor, de caixa
automática, desliga-se através de um botão inserido na própria alavanca das
mudanças. Um descuido levou a que o veículo ficasse em ralenti, enquanto a condutora participava num julgamento.
Uma situação mais recente passou-se junto a um
supermercado, em Azeitão. O homem vai lá diariamente. É mesmo desatento e até
já embateu no meu carro, que se encontrava estacionado. Mas daquela vez não só
colidiu com o veículo do lado como foi às compras sem tirar a chave da ignição,
não escutando sequer o ruído da máquina.
INDEMNIZAÇÃO
A revolta de José António Saraiva deriva da resposta
que a companhia de seguros lhe enviou. Dizem que não pagam o arranjo, uma vez
que não se provou a culpa da condutora segurada. Insinuam mesmo que os estragos
teriam sido causados anteriormente, por qualquer outro motivo.
O jornalista faz questão de aludir ao nome da empresa
em causa, anunciando: “com companhias de
seguros assim, ninguém está seguro”.
Em boa verdade, é o que se passa com todas as
seguradoras. Frequentemente, evitam assumir as responsabilidades. Mesmo quando
suportam as despesas, procuram reduzi-las ao mínimo possível. E forçam os
lesados a colocar um processo judicial em tribunal.
Com essa mesma firma, há muitos anos, tive um caso
curioso. Hoje já não poderia suceder, porque houve mudança de procedimentos.
O mediador passou um certificado provisório. O veículo
foi utilizado apenas durante uns dias. Como o angariador acreditou que não acontecera
nenhum acidente, acabou por destruir a proposta de apólice. A companhia não
chegou a tomar conhecimento do contrato.
O problema é que, naquele curto período, ocorreu mesmo
um atropelamento, com intervenção policial.
Apesar do erro cometido pela empresa mediadora, eu não
tive dúvidas. Considerei o seguro válido e condenei a companhia a pagar uma
avultada indemnização à vítima.