terça-feira

ÓPERA CHINESA



Guardo boas memórias de José Oliveira Ascensão.
Não foi meu professor na universidade. Mas deu-nos algumas aulas a convite, visto que todos estudávamos pelo seu excelente manual de introdução ao Direito, editado pela Fundação Gulbenkian.
Em 1988, ocorreu uma situação desagradável. Já próximo do final do ano letivo, uns quantos finalistas estavam acompanhados por uma animada tuna e irromperam pela sala do corpo docente. Ao avistarem o estimado mestre, decidiram fazer uma brincadeira com um dos seus apelidos e entoaram a canção “Oliveirinha da Serra”.
O problema foi quando alguns desses alunos se tornaram incomodativos e já aborreciam o especialista em questões de propriedade intelectual. Para evitar mais arrelias, Oliveira Ascensão decidiu retirar-se por uma porta que dá acesso direto à Alameda da Universidade, mesmo em frente ao edifício da reitoria.
Ainda assim, aquele pequeno grupo decidiu perseguir o lente, levando-o a correr pela artéria abaixo até apanhar um táxi e ver-se livre daquele autêntico assédio.
Dois dias depois, à porta da Faculdade, encontrava-se afixado um aviso subscrito por Marcelo Rebelo de Sousa. Ficou proibida a venda de bebidas alcoólicas no bar da instituição.
Foi uma sensata maneira de reprovar aquela atitude pouco edificante.


MUITO LONGE

Algum tempo depois, a nove mil quilómetros dali, Oliveira Ascensão viu-se envolvido noutro caso algo invulgar, mas esse com uma componente divertida.
O meu Amigo Gonçalo Xavier acompanhava-o em Pequim, como intérprete de chinês.
Ao mesmo tempo, ia preparando alguns programas de lazer, que permitiram ao professor conhecer aquela cidade, nunca antes visitada por ele.
De maneira que o sínico propôs irem à ópera, após o jantar. Mas esqueceu-se de prevenir que, na China, trata-se um espetáculo de cariz popular. É levado a cabo em plena rua, num daqueles palcos desmontáveis, em ambiente de festa, muito informal.
À hora combinada, os dois encontraram-se no átrio do hotel.
O tradutor teve dificuldade em disfarçar a surpresa quando viu que o professor saíra do quarto, vestido a rigor, em traje de cerimónia, como quem vai ao São Carlos. Envergava um elegante smoking e exibia um distinto laço preto.
Lá foram mesmo assim e tudo terminou com boa disposição.