Todos compreendemos o desagrado da jurista da Câmara Municipal de Lisboa, que guiava um pequeno Toyota Yaris embatido pelo potente Mercedes em que seguia Mário Soares. Só nos fica bem colocarmo-nos na posição de paladinos dos mais fracos.
O motorista da viatura de luxo entregou um papel à
senhora, com a anotação de um número de telefone. Deixou-a ali, seguindo
viagem.
Segundo consta, duas pessoas relataram que o antigo
presidente da república teria feito um gesto para que o seu condutor se
apressasse e prosseguisse o trajeto.
Algumas reflexões poderiam ser feitas a propósito de
ética, moral, cortesia e civismo.
Uma especial simpatia poderia levar a que o
ex-chefe-de-estado, embora alheio ao sinistro, se mostrasse preocupado com o
bem-estar de alguém que sofrera uma pequena colisão.
IGNORA E MANDA ARRANCAR
Numa perspetiva jurídica, devemos apreciar o que é de
lei.
O político era simples passageiro. Nada tem que ver com
a forma como era dirigido o veículo.
Está exatamente na mesma posição em que se encontra um
guia turístico relativamente ao autocarro em que são transportados os
viajantes. Comunica instruções ao automobilista, indica-lhe destinos, percursos
e locais de paragem. Mas o cumprimento das regras compete a quem vai ao
volante. Como diz o código da estrada, todo o veículo tem um condutor, a quem
incumbe proceder ao transporte dos passageiros sem comprometer a respetiva
segurança.
Em caso de acidente com feridos, compete-lhe prestar
assistência. Se não o fizer, pratica um crime.
Na ausência de sinistrados, como era o caso, o condutor
deve comunicar o seu nome, quem é o dono da viatura e qual o número da apólice
de seguro. Se lhe for pedido, é obrigado a exibir os documentos. Não cumprindo
esta responsabilidade, fica sujeito a uma multa de 120 euros.
Tratando-se de um carro pertencente ao Estado, o mais provável
é que nem sequer disponha de seguro. Assim, quem o guiava apenas tinha de dizer
o seu nome completo.
Em qualquer das situações, o pior seria deixar o automóvel imobilizado
no local do acidente. Violaria o artigo 87 do código da estrada. Acima de tudo,
criava uma situação de perigo e provocava embaraço para o trânsito.
Tudo o resto são falsidades para tentar vender jornais.