Centeno enviou uma mensagem ao
primeiro-ministro para ver se ele o ajudava a livrar-se de uma dívida ao banco.
Tinha investido em ações de uma empresa energética e andava aflito mesmo após
lhe ter sido concedida a reforma de uma letra.
Estava-se em 1931 e o milionário algarvio
pretendia que Salazar intercedesse junto do Banco Nacional Ultramarino.
António Centeno era o principal acionista
das Companhias Reunidas de Gás e Eletricidade. A instituição financeira
concedera-lhe um empréstimo avultadíssimo. O incumprimento por parte do
industrial colocava em sério risco a sobrevivência do BNU, que não estava em
condições de suportar o incumprimento.
O ditador de Santa Comba Dão valeu a todos.
Atendeu ao pedido do empresário, que lhe escrevera uma longa carta, solicitando
auxílio na concessão de uma moratória. O presidente do conselho de ministros impediu
ainda a falência do banco, que mais tarde foi absorvido pela Caixa Geral de
Depósitos. É claro que tudo foi feito com sacrifício dos contribuintes, tal
como continua a suceder nos dias de hoje.
QUEDA
Por aquela altura, suicidavam-se muitos
homens caídos em desgraça, atirando-se de arranha-céus nova-iorquinos, na
sequência da grande depressão gerada pelo crash
bolsista.
Não há memória de algo semelhante ter
ocorrido no nosso país.
PALAVRA
Mas antes disso, quando ainda não se
adivinhavam os problemas iniciados na quinta-feira negra de 1929, António
Centeno foi responsável pela morte de um conhecido político.
O óbito ocorreu ali para os lados do Campo
Grande, onde hoje se localiza o Caleidoscópio metamorfoseado em McDonald’s. No
que então era a periferia da capital, funcionava o hipódromo explorado pelo
Jockey Club, amplo espaço destinado a corridas de cavalos.
Tratava-se de local apropriado para
defrontar o republicano António Beja da Silva, que assumia o cargo de
vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
O autarca denunciara publicamente a falta
de palavra de Centeno. Este gestor, por tal sinal adepto da monarquia, garantira-lhe
que iria suspender o previsto aumento de aluguer dos contadores de gás. No
entanto, o preço subiu logo de seguida.
Despeitado pela revelação daquele
compromisso falhado, o negociante, já com 70 anos de idade, entendeu desafiar o
opositor para um duelo. Confiava nos seus dotes de espadachim, apesar de o
político ser muito mais novo, contando 47 anos.
O combate foi presenciado por muitos e mereceu
a cobertura mediática própria daquele ano de 1925, incluindo reportagem
fotográfica.
Os media
não utilizavam ainda uma expressão, mais tarde em voga, dando conta de que
estiveram presentes as autoridades civis, militares e religiosas e muito povo.
Aliás, o código penal já criminalizava os
duelos. Nunca as corporações administrativas e castrenses se fariam representar.
Ao clero nem sequer era reconhecida autoridade, naqueles tempos de estertor da
I República. Povo havia certamente algum a quem não repugnava minimamente a
censura legislativa desse tipo de bicínio livremente aceite por ambas as
partes.
A contenda terminou em tragédia.
De espada na mão, António Beja da Silva
sofreu um ataque cardíaco e feneceu antes sequer de ser atingido, ao de leve
que fosse, pela arma do antagonista.