Nas minhas funções de Diretor de Protocolo
do Rotary Club do Barreiro, assumi a tarefa, com êxito, de apresentar
palestrantes de projeção nacional, que prestigiaram a agremiação.
Naturalmente, muitos dos oradores
escolhidos eram formados em Direito. Mas tinham-se destacado mais em áreas
diversas das leis.
Assim, quando José Hermano Saraiva
apresentou a sua preleção no restaurante “Acordéon”,
não falou da sua atividade como Advogado, mas sim sobre os anais de
Timor-Leste, já que se encontrava presente a embaixadora daquele país.
NOIVOS
Escolhi aquela famosa casa de restauração
porque merecia apoio, depois de dois episódios desafortunados.
Durante um casamento, o teto veio abaixo.
Os noivos e os convidados acabaram no hospital, alguns com certa gravidade,
conduzidos pelas ambulâncias que, em corrupio, não cessavam de chegar e partir
a alta velocidade.
Após a reconstrução do espaço, deu-se um
novo desaire. Um grupo de enfermeiras reuniu-se ali para a despedida de uma
colega que se aposentara. Poucas horas depois, estavam todas na unidade de
saúde, não para trabalhar, mas como pacientes na sequência de uma intoxicação
alimentar.
PETRARCA
Uns dias depois da palestra do historiador,
estive em Lisboa, na estufa fria. Decorria uma original iniciativa, a Feira
Jurídica, na qual eu dispunha de um belo stand concebido por um atelier
nortenho.
Vasco Graça Moura estava presente e eu
propus-lhe que fosse o tribuno seguinte daquele clube rotário. Mais uma vez
sugeri que a conversa não se centrasse em questões jurídicas ou no cargo de
eurodeputado que o intelectual ocupava.
O social-democrata acabara de ser
distinguido com um prémio que assinalava a sua brilhante tradução de poemas de
Petrarca. Assim, dialogou-se sobre o escritor italiano.
COSMOPOLITISMO
Há muito que Vasco Graça Moura estava
divorciado da filha de Miguel Torga.
Ele vivia em união de facto com a
lindíssima Maria Bochicchio, cidadã italiana, responsável pelas bibliotecas
itinerantes da Fundação Gulbenkian. Após a morte do jurista, ela viveu um
intenso romance com Rui Moreira, autarca do Porto.
Durante aquele jantar barreirense, eu
decidi sentar a distinta senhora ao lado do embaixador da Austrália, meu grande
amigo que já vivia há algum tempo em Portugal, mas que não compreendia nada da
nossa língua.
A embaixatriz permaneceu à esquerda do
orador. Ficou agradavelmente surpreendida com a sua fluência em inglês.
Entretanto, a italiana e o australiano
estavam animadíssimos, mais pela simpática troca de palavras do que pela
refeição, de grande nível aliás.
Até que, já servidos os cafés, Vasco Graça
Moura dirigiu-se ao púlpito, onde proferiu um brilhantíssimo discurso, na
língua lusa naturalmente.
Lyn, a mulher do diplomata, resistiu
estoicamente mantendo uma compostura de atenção, embora efetivamente não
entendesse o que estava a ser dito.
Maria Bochicchio bebia as palavras do homem
que amava, interrompendo obviamente a cavaqueira com o Gregory.
O embaixador não aguentou.
Tinha tido um longo dia de trabalho, já se
fazia tarde e o jantar certamente soubera-lhe bem.
Caiu nos braços de Morfeu.
Enquanto o palestrante discorria sobre a
obra poética, o diplomata dormiu até ser despertado pelo aplauso com que os
presentes brindaram o orador.