Abílio detestava o homenzinho. Deu-lhe
emprego e ele não correspondeu à submissão que era esperada.
Despedido, António Teixeira nunca mais
parou de dizer cobras e lagartos do ex-patrão.
A hostilidade mútua transformou-se numa
guerra sem quartel.
Certo dia, rebentou uma bomba na casa do
antigo empregado. Mas não foi ele que morreu. Finou-se a esposa, vítima
colateral de uma inimizade que não lhe dizia respeito.
ÉDIPO
Tudo se passou em Santo Tirso, terra onde o
empresário nortenho enriqueceu, com uma importante fábrica têxtil por ele
fundada, graças a muito trabalho que superou as suas humildes origens e a fraca
instrução, resumida à quarta classe.
Abílio mantinha uma estranha relação com
seu Pai.
Alcançada a fortuna, tornou-se patrão do progenitor
e colocou-o nas modestas funções de porteiro da grande empresa Flor do Campo.
Todas as manhãs, o velhote cumprimentava o industrial, como se não fossem
familiares, por imposição do descendente que chefiava a empresa:
- Bom Dia, Senhor Oliveira – dizia o pobre
indivíduo.
DESPEDIMENTO
Era assim que o negociante gostava que os
seus subordinados se vergassem.
Ora António Teixeira, o tal infeliz cuja
casa mais tarde foi pelos ares, não estava por esses ajustes. Aceitou o emprego
na fábrica, pois o salário assegurava-lhe a subsistência. Mas recusou
sujeitar-se a vexames.
A relação laboral pouco durou, terminando
pela vontade do insatisfeito patrão.
RANCOR
Em jeito de vingança, o rancoroso homem
despedido passou anos a lançar notícias contra o empresário.
Dizia que, certa vez, o industrial colocara
de castigo o pai-
-empregado. Só porque, em conversa com um visitante, o idoso teria confidenciado orgulhosamente a relação de parentesco. O porteiro foi temporariamente despromovido a responsável pela limpeza das fossas do esgoto.
-empregado. Só porque, em conversa com um visitante, o idoso teria confidenciado orgulhosamente a relação de parentesco. O porteiro foi temporariamente despromovido a responsável pela limpeza das fossas do esgoto.
O operário dispensado contava ainda que Abílio
denunciou à polícia política um funcionário, eletricista de profissão, que
propositadamente destruíra a instalação por ele montada dias antes. Soube-se
que a vítima fora torturada por agentes da PIDE e que mais tarde desaparecera
sem dar notícias. Os familiares do técnico passaram a envergar luto.
BOMBAS
Uns tempos depois, no período
revolucionário em curso, formou-se uma poderosa rede bombista de direita, que
se contrapunha aos perigosos terroristas da extrema-esquerda.
A cruel organização era financiada por
milionários desgostosos com a revolução dos cravos, entre os quais se incluía
Abílio Oliveira. Tudo se encontra relatado no magnífico estudo de Miguel
Carvalho, intitulado “Quando Portugal
Ardeu”, em que se narram estes episódios.
O dono da unidade industrial avançou com
elevados montantes que permitiram recrutar mercenários, adquirir armas,
fabricar engenhos explosivos, pagar deslocações e custear os alojamentos.
Um dos elementos selecionados para o
trabalho sujo foi Ramiro Moreira. O delinquente inteirou-se de quem eram os
inimigos do capitalista tirsense.
E assim chegou à residência do desgraçado Teixeira,
onde provocou uma gigantesca explosão. A mando expresso do industrial, segundo o
operacional confessaria mais tarde. Por voluntarismo, ultrapassando as
intenções do empresário, de acordo com este.
O proprietário da casa destruída em 21 de
maio de 1976 encontrava-se no seu interior, mas sobreviveu. Ficou gravemente
ferido e após um longo internamento hospitalar foi realojado.
O grande drama foi ter-se perdido a vida de
Rosinda, de 40 anos, a sua amantíssima esposa, principal vítima do atentado.
Logo após o crime, Abílio Oliveira
refugiou-se em Vigo, no país vizinho, aguardando o desfecho do longo julgamento
que o envolvia como acusado de integrar aquela máfia assassina.
Com o seu sotaque nortenho, ele protestava
inocência, clamando desconhecer que os dinheiros se destinavam a explosões:
- Eu não sei nada de vonvas.