Uma mulher portuguesa assassinada pelo
marido não passa em claro na comunicação social nacional, felizmente.
Ginecídio, ginocídio, femicídio ou
feminicídio: não se arranja neologismo apropriado para algo tão barbaramente
impróprio.
Contudo, a dificuldade de encontrar
denominação aceitável nunca impediu os jornalistas de nos alertar sempre que
tal desgraça ocorre.
Há, porém, um caso pouco conhecido,
precisamente porque sucedeu em França, país que acolhia Maria Paula Monteiro,
casada com um polícia de Montpellier.
VENENO
Jacques Prévosto começou por fazer
pesquisas na internet sobre a forma de disfarçar o sabor de venenos em
alimentos, mas resolveu estrangular a mulher de 36 anos, com quem tinha dois
filhos.
Depois, colocou o cadáver no carro.
Conduziu até à autoestrada e lançou fogo ao
automóvel.
De seguida, ligou para o 112. Contou que
sofrera uma avaria, após o que o veículo se incendiou no momento em que ele
colocava o triângulo de sinalização na estrada. Lá dentro, ficara a esposa.
O gendarme
que compareceu no local não se deixou convencer pela versão do colega.
O corpo de Paula apresentava-se bem assente
no lugar dianteiro do passageiro. Claramente não tinha havido tentativa de
escapar a chamas.
SUICÍDIO
Já em prisão preventiva, o viúvo entrou em
negação e procurou explicar-se de outra maneira.
Realmente, ele pegara fogo intencionalmente
ao veículo quando a portuguesa já estava sem vida.
Simplesmente, ela cometera suicídio e até
deixara uma carta de despedida. Ao deparar-se com aquele cenário, o homem não
teve coragem de comunicar às crianças que a Mãe decidira abandoná-los e colocar
termo à vida. Por isso, encenou a morte por acidente, após ter rasgado a
missiva deixada pela falecida.
Esta nova modalidade foi de uma crueldade
enorme para com os meninos e demais familiares da defunta. Viram-se na
contingência de ter de provar que a senhora nunca pensara em colocar termo à
vida nem tinha motivos para tal.
Os peritos que realizaram a autópsia vieram
a afastar categoricamente a mentira inventada pelo homicida. A vítima morrera
estrangulada por terceiro.
IRMÃ GÉMEA
Jacques foi acusado e levado a julgamento,
apesar de não admitir o horroroso crime.
Perante os juízes, declarou estar inocente.
Mas, na terceira sessão da audiência,
ocorreu aquilo a que chamamos golpe de teatro, uma viragem improvável que muda
radicalmente o rumo das coisas.
Maria Paula tinha uma irmã gémea
heterozigótica, univetelina, idêntica mesmo.
Elisabete meteu-se num avião e viajou até
França.
Com cada uma das suas mãos agarrou
gentilmente nos pequenos sobrinhos, de 6 e 9 anos, cuja progenitora se
encontrava no cemitério.
Caminhando com as crianças, entrou na sala
do tribunal e fitou o arguido.
A imagem que o homem viu foi a da esposa a
quem ele subtraíra a capacidade de viver, passeando de mão dada com os filhos
do casal.
Perturbado, desviou o olhar.
Quando a gémea começou a depor na qualidade
de testemunha, o criminoso não suportou ouvir aquela voz, igualzinha à de Maria
Paula.
Tentou tapar os ouvidos, mas a depoente
elevou o tom.
Jacques Prévosto levantou-se. Olhou para
trás, observando o público, e já diante do juiz-presidente proferiu palavras
impressionantes.
Disse então:
- Como todos sabem, eu matei a minha mulher.