quarta-feira

QUE BOM ESTAR PRESO




Quem mata o pai, a mãe, o avô, o filho ou o neto é punido severamente pela prática do crime de homicídio qualificado. Pode levar com 25 anos de prisão.
Já no caso de alguém assassinar o irmão, apenas comete o crime de homicídio simples. Na pior das hipóteses, cumprirá 16 anos de cadeia.
Em termos jurídicos, diz-se que, nesta segunda situação, não há especial censurabilidade ou perversidade.
Quando todos os irmãos de relacionam muito bem entre si, costuma logo questionar-se se já foi ou não realizada a partilha da herança.
Quando a resposta é negativa, afirma-se que aí está a explicação.
Não sou assim tão pessimista.
Comigo, somos cinco irmãos, todos com vidas muito diferentes, mas mantendo um convívio muito saudável.
Conheço inúmeros casos idênticos, em famílias de dimensão inferior e noutras mais numerosas.


ATENTADOS

Mas, no domínio judicial, também sei de situações dignas de honrar a velha tradição de Caim e Abel. A rivalidade entre irmãos e as guerras fraternais, frequentemente, reflectem-se em processos criminais.
Mundialmente, o caso mais divulgado foi o do Unabomber, o tristemente célebre Dr. Ted Kaczynski.
Durante dezassete anos, em vários pontos dos Estados Unidos da América, deflagraram bombas que causaram algumas mortes nos meios universitários.
O autor dos atentados era desconhecido. Mas o FBI referia-se a ele pelo nome de Unabomber.
Em 1995, o criminoso fez uma proposta.
O jornal Washington Post publicaria o seu extenso manifesto, em que ele se pronunciava contra o desenvolvimento industrial.
Em contrapartida, terminariam definitivamente os actos terroristas.
A matéria foi alvo de amplo debate, em torno de duas questões essenciais.
Em primeiro lugar, estava em causa a negociação com terroristas. Seria admissível ceder a uma chantagem?
Depois, colocava-se o problema da liberdade de imprensa. Em que medida deveria um órgão de comunicação social disponibilizar as suas páginas só para colaborar no combate ao crime?
Realizada toda esta discussão, o jornal acabou por dar à estampa o manifesto, que foi lido por milhões em todo o mundo. Os bombardeamentos cessaram.
Pouco depois, Kaczynski foi preso.
Rapidamente se soube como foi descoberto o criminoso.
David era o seu irmão mais novo.
Ao ler o artigo, reconheceu imediatamente o estilo do seu irmão e identificou as opiniões há muito defendidas por ele.
Denunciou-o à polícia, estabelecendo como condição nunca ser revelado de quem partira a comunicação.
Todavia, este segredo tornou-se público em pouco tempo, devido a uma fuga de informação no FBI.
Desmascarado, David acabou por doar o dinheiro da recompensa aos familiares das vítimas.



PROCURADOR

Ainda nos tempos de administração britânica, residia em Hong Kong um australiano, que ali desempenhava as funções de procurador no tribunal.
O seu irmão mais novo era um advogado sem sucesso na Austrália e que buscara uma nova oportunidade em Hong Kong, com ajuda fraternal.
Mudou-se e contou com auxílio do irmão, bem estabelecido na então colónia inglesa.
Mas com o passar do tempo, tornava-se cada vez mais evidente a diferença de êxito profissional entre os dois. O mais novo ia somando fracassos, ao mesmo tempo a que assistia à ascensão da carreira de seu irmão.
Até que um dia ele soube que o procurador recebera uma importante soma em dinheiro para arquivar um processo criminal.
Informou as autoridades e o seu irmão corrupto foi condenado a dez anos de prisão.
De todo o modo, nestes dois casos, o irmão rival denunciou um crime real.
Todavia, é muito frequente um criminoso assumir a identidade de um seu irmão, para tentar eximir-se à sua responsabilidade.
Aqui há dez anos atrás, em Coruche, os armazéns da Grula foram assaltados, durante a noite, por um grupo de três ladrões. Entre estes, contava-se um indivíduo de nome Paulo Jorge, que tinha um irmão gémeo.
Sucede que a GNR apanhou-os em flagrante.
Quando foi detido, o Paulo Jorge disse não ter consigo o bilhete de identidade. Forneceu o nome do seu irmão gémeo José Manuel.
O azar dele é que o gémeo tinha o álibi perfeito.
Seria de mau gosto dizer que o José Manuel fora bafejado pela sorte.
Mas a verdade é que era facílimo ele provar a sua inocência. Precisamente porque este gémeo também era bandido.
Na noite do assalto, ele encontrava-se preso em Alcoentre.