terça-feira
A CRIADA ALCOÓLICA
Durante longos anos, ela foi criada de servir em Lisboa. Era muito dedicada à família em cuja casa vivia.
Ainda relativamente jovem, deixou a capital e foi viver para Alpriate, em Vila Franca de Xira.
Como forma de manifestar a gratidão, os antigos patrões ofereceram-lhe jóias de valor.
Pouco depois, ela conheceu um abastado construtor civil. Viveu com ele até o indivíduo falecer, em meados dos anos noventa.
Com a morte do seu companheiro, a senhora começou a afogar as suas mágoas no vinho. Rapidamente, atingiu as características suficientes para se poder afirmar que padecia de alcoolismo. Sofria mesmo de cirrose hepática.
Os seus parentes mais próximos estavam longe. Residiam no Brasil.
Felizmente, a antiga criada de servir encontrou um casal que dela cuidou. Estimularam-na a ser acompanhada por um médico. O tratamento foi moroso e complicado, mas revelou-se totalmente eficaz, graças também ao empenho dos dois amigos, que a vigiavam minuciosamente, para além de lhe providenciarem todo o carinho.
Por esta altura, a senhora já era dona de várias propriedades.
Mas as casas não estavam em bom estado e alguns dos terrenos nem sequer se encontravam registados em seu nome.
O casal amigo organizou a sua vida, por forma a continuar a dar assistência à senhora.
O ideal era os dois reformarem-se antecipadamente e disporem de tempo suficiente para se encarregarem dela.
A senhora – já um tanto idosa – não tinha dinheiro depositado no banco.
Mas fez um testamento, através do qual deixou alguns bens ao casal.
Tal foi determinante para que os amigos se decidissem a deixar de trabalhar, tendo em consideração que, um dia, viriam a ter o seu futuro melhor assegurado.
Além disso, havia um outro documento importante.
Perante o notário, ela declarou-se devedora de uma elevada quantia àqueles dois amigos.
No tribunal, após a morte da antiga criada, debateu-se uma questão relevante: a que dizia respeito aquela dívida?
Os familiares da falecida defendiam que não havia dívida nenhuma. Tudo não passava de uma simulação para que, com a morte dela, o casal se viesse a apoderar de muito dinheiro.
O casal amigo afirmava que tal respeitava a um empréstimo.
O processo judicial terminou por questões meramente processuais, de carácter técnico. Foi logo dada razão ao casal, pelo facto de os familiares não terem formulado convenientemente a sua pretensão perante o juiz.