quinta-feira
A MINHA CASINHA
Anteriormente, aludi aos Governadores Civis.
Referi que, actualmente, são escolhidas personalidades de grande mérito, que conferem ao cargo um prestígio superior ao que se poderia esperar em funções que implicam escassos poderes desempenhados numa instituição em vias de extinção.
Curiosamente, a situação era a inversa quando os Governos Civis estavam para durar.
Nos tempos do Estado Novo, o governo central fazia-se representar nos distritos por indivíduos a quem frequentemente faltava habilidade para as mais vulgares incumbências: as inaugurações.
Tudo era pretexto para mais uma inauguração.
O jardim zoológico era ainda um espaço em grande expansão, em que as jaulas consistiam no espaço paradigmático de habitação dos animais em exposição.
Actualmente, a presença de animais em zoos e circos está em declínio.
Os zoológicos já existentes subsistem, mas tendem a alargar o âmbito das suas actividades. São mais propriamente parques de diversão do que apenas espaços onde os seres irracionais são expostos.
É praticamente nula a abertura de novos jardins zoológicos.
Quanto aos circos, são vários os que já não contam com números envolvendo animais. Mesmo naqueles em que tal não sucede, são cada vez mais raras as espécies selvagens e exóticas.
Ora há quatro décadas atrás, ainda não se registavam estes movimentos.
Uma nova jaula no Jardim Zoológico de Lisboa era motivo para cerimónia oficial.
O Governador Civil da capital, Afonso Marchueta, foi convidado para presidir à inauguração de uma nova jaula.
Preparou um discurso, que veio a ler perante a assistência e os jornalistas, junto ao novo espaço de cativeiro animal.
Ao redigir a dissertação, lembrou-se de homenagear o seu padrinho de eleição, Marcello Caetano, ao mesmo tempo que aproveitava para glorificar o jardim zoológico.
É claro que este dois-em-um não poderia resultar bem.
Contudo, o governador civil lá terá entendido que era uma boa ideia.
Em tempos, o Presidente do Conselho, Marcello Caetano, dirigira a mesa da assembleia geral do zoo.
No meio da bicharada, Marchueta saiu-se com esta:
- Nesta casa de que foi figura o Professor Marcello Caetano, eu sinto-me como em minha própria casa.
Este bizarro episódio foi contado por quem correu a alertar a censura, para impedir que a imprensa publicasse o discurso do governador civil. Com efeito, o jornalista Manuel Maria Múrias logrou que o lápis azul recaísse sobre as palavras de Marchueta. Relata-o agora no livro “De Salazar a Costa Gomes”.
Numa outra ocasião, não obstante o seu nome próprio, Afonso Marchueta recebeu a distinção de sócio honorário do grupo “ Os Josés de Portugal”, facto amplamente noticiado nos media.
Ainda há quem diga que o grande humorista da política é o Ministro das Obras Públicas, Mário Lino…