quarta-feira
FELICIDADE
Disse o escritor Ivan Turgueniev que “a felicidade de cada indivíduo funda-se na desgraça de alguns outros”.
Eu não sei exactamente o que se passa com os homens que casam com mulheres viúvas ou divorciadas. Será que eles se sentem felizes pelo facto de a senhora ter perdido o marido?
Sei, todavia, o que se passou com um certo guarda prisional. Ele relatou a sua história a um jornalista da SIC. Pedro Coelho omitiu-a na reportagem transmitida em 2004. Mas menciona, agora, o episódio no seu livro “Rosa Brava”, no qual descreve vários casos que originaram peças televisivas.
Um agente policial foi assassinado. O criminoso veio a ser capturado e foi cumprir a sua pesada pena para a cadeia de Pinheiro da Cruz.
A vítima deixou viúva, que posteriormente refez a sua vida. Contraiu matrimónio novamente. Em segundas núpcias, voltou a casar com um agente da autoridade, mas desta feita com um guarda prisional. Tratava-se precisamente de um homem que exercia funções na prisão de Pinheiro da Cruz e que vigiava diariamente o assassino.
Nos dias em que Pedro Coelho ali permaneceu juntamente com o repórter de imagem, o guarda abordou o jornalista e contou-lhe a sua história. Acompanhou a descrição com algumas reflexões filosóficas de trazer por casa:
- Ele está aqui preso, eu guardo-o todos os dias e se hoje sou feliz a ele lhe devo. Se ele não o tivesse morto, eu nunca me teria casado. E sou feliz.
Esclareceu que o recluso não sabia de nada. Para ele, guarda prisional, o assassino era apenas mais um preso como outro qualquer.
O filósofo Leibniz era mais optimista. Dizia ele que “amar é encontrar na felicidade de outrem a própria felicidade”.
Efectivamente, é sempre preferível fazer com que a nossa felicidade não dependa da infelicidade de outras pessoas.
Para os presos, a privação da liberdade corresponde, quase sempre, a um momento de infelicidade.
Mas sabemos que há sempre um ou outro caso excepcional de pessoas que não têm vontade de sair da cadeia.
Certa vez, determinei a libertação de um arguido, por ter sido atingido o prazo máximo de prisão preventiva.
O homem surgiu-me no tribunal, com uma mala de viagem. Pretendia regressar à cadeia. Chegada a hora de encerramento do tribunal, ele recusava-se a abandonar as instalações.
Tive de mandar chamar a polícia. Não para prendê-lo, mas para colocá-lo em liberdade, à força.