sexta-feira

A FILHA DO ESPANHOL


O Mercado Municipal de Santarém, da autoria de Cassiano Branco, foi inaugurado há quase oitenta anos.
Outrora, aquele espaço era conhecido como Chão da Feira ou Fora da Vila.
Até ao início do século XX, ali funcionou a Taberna do Espanhol. Era uma zona pouco apropriada para casa de bebidas, pois tratava-se de local escassamente povoado.
Mas o dono pouco ralado estava com isso. Aliás, ele nem sequer era originário do país vizinho. O homem era bem português. Dedicava-se era mais à receptação de material roubado e ao comércio de produtos de contrabando, vindos do lado de lá da fronteira. Daí aquela alcunha alusiva a Espanha.
O taberneiro tinha dois filhos. Um casalinho. O varão seguiu a carreira criminosa do pai.
Maria da Conceição, a filha, era mais nova. Mariquinha – como era conhecida - não tardou a fazer do crime modo de vida.
Segundo se conta, desde os 10 anos, a rapariga andava pelas feiras do Ribatejo, circulando entre a população, apoderando-se sub-repticiamente de peças de ouro usadas pelas senhoras.
Certa vez, foi capturada no Cartaxo. Como devolveu o cordão à lesada e desatou a chorar, o administrador do concelho mandou-a embora e lá foi ela impune. Tinha doze anos de idade.
No entanto, em 1891, Maria da Conceição já não teve tanta sorte. Presente ao Juiz, este mandou-a cumprir três anos de degredo em África.
Não voltou regenerada.
A criminosa aplicou-se numa nova versão dos seus crimes.
Ao tempo, as carruagens dos comboios dividiam-se em três categorias. A terceira classe era a mais económica. Os assentos preenchiam-se e muitos dos passageiros viajavam de pé, ocupando os corredores.
Os dedos de Mariquinha iam subtraindo bolsas de dinheiro, pulseiras e cordões de ouro.
Por vezes, era apanhada em flagrante. Esteve presa na Cadeia de Coimbra, em diversas ocasiões. Em Novembro, por altura da Feira da Golegã, o negócio tornava-se particularmente rentável, para a ladra.
Foi precisamente numa dessas ocasiões de São Martinho, que dois agentes policiais capturaram Maria da Conceição, depois de terem embarcado propositadamente em sua busca.
Desta feita, pouco tempo passou na prisão. Considerando o cadastro, o juiz não hesitou em degredá-la para África, pela segunda vez.