sábado

O MISTÉRIO



O “Expresso” publicou uma interessante entrevista com os pais de Madeleine McCann, a menina desaparecida no Algarve.
Anteriormente, Paulo Cristóvão escrevera um importante livro, intitulado “A Estrela de Madeleine”. Há a considerar também “A Culpa dos McCann”, de Manuel Catarino. Hernâni Carvalho e Luís Maia redigiram “Maddie 129”. “Maddie – A Verdade da Mentira” é a mais recente obra, da autoria de Gonçalo Amaral.
Neste último livro, é sugerida uma hipótese. Ocorreu um trágico acidente, do qual resultou a morte da criança, no interior do apartamento ocupado pela família.
Nesse mesmo dia, à noite, o pai transportou o cadáver e escondeu-o ali perto, deslocando-se a pé, em direcção à praia.
Pouco depois, o corpo foi levado para um sítio onde a sua localização se tornasse mais difícil.
Tal poderia ter acontecido num filme realizado por Hitchcock, com Cary Grant. Mas nunca na vida real.


IMPOSSÍVEL
Nenhum magistrado do Ministério Público nem nenhum juiz seria capaz de aceitar esta absurda suposição. A mesma não faz sentido para quem – como eu – estudou Direito durante cinco anos na Faculdade e recebeu três anos de formação no Centro de Estudos Judiciários.
Mais facilmente eu acreditaria que a infeliz menor teria sido raptada por extra-terrestres…
Há pais ou mães que intencionalmente matam um filho. Praticam um homicídio voluntário. Decidem pôr termo à vida do filho e poderão até ocultar o respectivo cadáver. São assassinos capazes de tudo.
Porém, quando se trata de um falecimento acidental, nenhum progenitor vai dissimular o corpo. Vivo ou morto, trata-se de um filho, que é amado e para quem se deseja uma última homenagem.
Mesmo que tenha havido negligência, incúria ou desleixo por parte da mãe ou do pai, ele desejará proporcionar exéquias fúnebres, de acordo com a sua cultura, a sua etnia, as suas convicções e, se for caso disso, a sua religião. Nunca, em caso algum, lhe passará pela cabeça ver-se livre do filho.
Vou dar alguns exemplos reais.
Uma mãe adormeceu e, quando acordou, viu que a filha de dois meses de idade tinha caído dentro de uma panela de água a ferver, morrendo afogada. Obviamente, a progenitora telefonou para o 112.
Um casal de turistas veio de Espanha para passar as férias em Portugal, com o seu filho de 4 anos de idade. Num momento de desatenção, o pequeno desviou-se para a estrada e morreu atropelado. Aos pais, nunca lhes ocorreu esconder a tragédia.
Um pai viu o seu filho de três anos de idade debruçar-se da janela e cair de um oitavo andar, perdendo a vida. Naturalmente, jamais pensou em ir ocultar o cadáver e simular um rapto.


PERMANECERAM
Quem ainda acreditar que Gerald McCann foi enterrar a filha, deve reflectir sobre o seguinte.
Caso isso tivesse ocorrido, os pais de Maddie saberiam que ela estava morta. Temiam a investigação policial e a reacção das autoridades portuguesas. A sua consciência pesava-lhes.
Nessa situação, o que fariam? Logo após o corpo estar definitivamente escondido, ausentar-se-iam de Portugal.
No entanto, permaneceram durante quatro meses, no nosso país. Se receassem a justiça portuguesa e tivessem a consciência pesada, não ficariam por cá este tempo todo.
Se o Renault Scénic tivesse sido utilizado para transportar um cadáver, logo o casal McCann devolveria o veículo à empresa de aluguer e abandonaria o país.


RETIRARAM-SE
Os pais da criança apenas deixaram Portugal, num momento em que a actuação policial se tornou verdadeiramente inaudita. Tão esquisita que até o próprio Director Nacional da PJ admitiu que houvera precipitações.
Gerry e Kate só regressaram a Inglaterra após serem constituídos arguidos, na sequência de a averiguação ter tomado rumos erráticos. Naturalmente, retiraram-se quando se aperceberam que a investigação era de tal modo caótica que já os atingia a eles como suspeitos. Não estavam perante um trabalho metódico. Procedia-se à constituição de arguidos mais ou menos ao acaso.
Era difícil imaginar onde aquilo poderia ir parar. Só faltava desconfiarem dos pequenos gémeos, irmãos da menina desaparecida.
Robert Murat foi o primeiro arguido, sem se perceber muito bem porquê.
Depois, eram os próprios pais considerados suspeitos de uma assentada, como se fosse claro que os dois sabiam rigorosamente o mesmo sobre o caso.
Tratava-se de uma investigação sem rota, ao sabor dos ventos, para não dizer que se encontrava totalmente à deriva. Como era de esperar, naufragou e nunca se chegou ao culpado.
Recaindo suspeitas sobre os pais sem que se compreendesse a razão, eles terão concluído que era preferível irem embora antes que ocorresse algo ainda mais bizarro, no meio de uma investigação tão confusa e insólita.
Importa esclarecer um outro aspecto.
Um dos cães da equipa cinotécnica inglesa detectou odor a cadáver no peluche, com que Maddie brincava. Não é de admirar. Kate, a sua mãe, era constante portadora deste brinquedo, desde o desaparecimento da filha. A senhora praticamente não largava o boneco e levou-o para igrejas, onde esteve em contacto com as mais variadas substâncias.