terça-feira

DESASTRE



Passou-se no Verão de 2007.
Na esplanada de praia, o mais jovem insistia junto dos amigos:
- É mesmo o que está a dar. Os depósitos a prazo não rendem quase nada. O futuro está nas energias renováveis. Este fundo faz aplicações em empresas do ramo e tem tido uma valorização fabulosa.
Era tal o entusiasmo deste indivíduo que eu não pude deixar de ouvir a conversa.
Na altura, pensei no óbvio: a vitória tem milhares de paternidades, mas a derrota é órfã.
Se um daqueles amigos seguisse a sugestão e, realmente, ganhasse algum dinheiro, logo concluiria: “foi uma fezada que tive naquele momento; eu bem sabia que aquilo ia render”. Caso viesse a perder, não deixaria de amaldiçoar o conselho: “aquele tipo tinha de vir com palpites e pensar que previa o futuro…”.
A verdade é que, no Verão seguinte, aquele fundo baseado nas energias renováveis e gerido por um importante banco português apresentava um declínio significativo. As condições de resgate não beneficiavam nada quem quisesse desistir, pois teria sempre de aguardar algum tempo.
Quem nele investiu, perdeu muito.
E ainda não se adivinhava sequer a crise financeira internacional que vinha aí…



Soube de um caso interessante, mas que abalou terrivelmente uma família, acostumada ao conforto.
Habitavam uma magnífica casa na Quinta do Peru, adquirida graças a alguns anos passados em Bruxelas.
Durante esse período de emigração, o elemento masculino do casal deslocou-se a Portugal sozinho, numa certa ocasião. A gestora da conta bancária verificou que havia ali um depósito à ordem de quase cinco mil euros.
Decidiu sugerir uma aplicação para aquele montante.
Realizou um simpático telefonema ao titular da conta:
- Senhor Doutor, tenho aqui uma sugestão para lhe fazer. Efectue um pedido de aquisição de acções nesta empresa inglesa. Terá de solicitar a compra de cem mil euros. Os pedidos são muitos e estão sujeitos a rateio. Normalmente, fica-se com 5% do que se requer. Por isso, se pedir cem mil euros, dever-lhe-ão ser atribuídas acções no valor de cinco mil euros.
Ele correspondeu ao convite. Passou pelo banco e assinou toda a papelada, convenientemente preenchida pela solícita funcionária.
Ainda não tinha ele regressado a Bruxelas, quando veio a notícia. Afinal, não tinha havido assim tantos pedidos de aquisição como era previsto. Foram-lhe mesmo atribuídos todos os títulos pedidos, com o custo de cem mil euros.
Porém, não havia motivo para preocupação, segundo afirmava a sempre prestável gestora de conta.
Bastaria o senhor doutor contrair um empréstimo e, com esse dinheiro, comprar as acções. Estas iriam certamente valorizar-se. Quando ele entendesse apropriado, vendê-las-ia, liquidando o mútuo e embolsando a mais-valia.
Só em parte tal viria a suceder, efectivamente. Ele assumiu o empréstimo e adquiriu os títulos.
Na realidade, as acções nunca se valorizaram. Pelo contrário, a sua cotação caiu a pique.
Decorridos uns meses, nem valia a pena colocar a hipótese de as vender. O seu valor estava muitíssimo abaixo dos cem mil euros que tinham custado.
O problema é que começaram a ser exigidas as prestações para pagamento do empréstimo.
Inicialmente, o homem nem se sentia com coragem de contar o sucedido à sua própria mulher.
Quando regressaram definitivamente a Portugal, acabou por relatar tudo. Já era previsível um processo judicial em Tribunal intentado pelo Banco, como realmente viria a ocorrer.
A dívida atingia já um valor astronómico, considerando os juros, sendo certo que a taxa cobrada era particularmente elevada.
Foi um desastre total. Tudo começara com uma sugestão para aplicar cerca de cinco mil euros. Terminou com a perda da fantástica casa, no conhecido condomínio de luxo.