quinta-feira

A VEDETA



A Agência Nacional de Aviação Civil do Brasil e a Infraero – Aeroportos do Brasil não têm qualquer responsabilidade sobre o trágico acidente ocorrido com o voo 447 da Air France, que partiu do Aeroporto Tom Jobim.
Disso não tenho dúvidas.
Não fazem sentido as especulações em torno de que não existiu um aviso quanto às más condições atmosféricas.
A língua inglesa é mais rica do que a nossa, no que respeita ao vocábulo segurança. Existem duas palavras. “Safety” refere-se à prevenção no sentido de que não se verifique um acidente. “Security” faz alusão às medidas tomadas para evitar actos terroristas, violentos ou de pirataria do ar.
Ora, em matéria de segurança – nas duas acepções mencionadas -, nada foi descurado pelas autoridades brasileiras.


VOO MUITO ESPECIAL
Aqui há trinta e cinco anos atrás, o nosso Governo solicitou redobrados cuidados num voo muito especial, que fez a ligação entre Portugal e Brasil.
O avião partia do Funchal. A exigência fundamental foi a de que a aeronave aterrasse no aeroporto de Viracopos, em Campinas. Trata-se de uma localidade pequena e distante dos grandes centros.
O objectivo era evitar uma manifestação de apoio por parte de alguns portugueses, relativamente aos dois passageiros principais: Américo Tomás e Marcello Caetano, depostos em 25 de Abril de 1974.
Até à chegada ao Rio de Janeiro, uma personagem secundária foi criando quezílias constantes. Tratava-se de Natália Tomás, filha do ex-Chefe de Estado.
Aparentemente, a personalidade dela era do tipo conflituoso.
Na minha infância, via-a diversas vezes na Pastelaria Bénard, no Chiado, que ela frequentava quase diariamente. Não me recordo de, em ocasião alguma, ter assistido a qualquer episódio mais agitado. Mas consta que ela era particularmente exigente com os empregados de mesa.
Curiosamente, o mesmo estabelecimento amiúde recebia clientes opostos ao regime, como Urbano Tavares Rodrigues e João Gomes.



CHEGÁMOS À MADEIRA
Já após a revolução, no Funchal, as famílias Tomás e Caetano coabitaram, até partirem para o país irmão, em 20 de Maio de 1974. Durante esse curto período, viveram numa espaçosa e confortável residência, servida por criadagem doméstica.
A cozinheira fora requisitada a um hotel, por um custo mensal de dez mil escudos. Um Mini custava apenas quatro vezes mais. O ordenado de uma empregada doméstica interna rondava os mil escudos, antes de ser fixado o salário mínimo.
Natália não deixou de armar confusões. Permanentemente, responsabilizava Marcello Caetano pela queda do regime. Por outro lado, culpava o pai por não ter exonerado atempadamente o Presidente do Conselho.
As zangas eram de tal ordem que as famílias cortaram relações. Passaram a tomar as refeições em mesas separadas.



MEU BRASIL, BRASILEIRO
Quando chegou o dia de partirem para o Brasil, Natália insistia em querer usar o seu passaporte diplomático. Neste constava um espaço para a profissão, onde figurava: “Filha do Chefe de Estado”. A senhora recusava trocar o dito documento de viagem por um novo, ordinário. Muito contrariada, Natália acabou por ceder.
Para alcançar o Rio de Janeiro, a família Tomás utilizou um voo doméstico. Durante a viagem, Natália criou algum rebuliço.
Já na cidade carioca, ficaram instalados na casa de Aventino Laje, que os acolheu com a maior das boas vontades. Porém, a filha de Tomás amesquinhava as refeições, repreendia os criados e queixava-se da forma como as roupas eram tratadas. Sendo insustentável manter a situação, Aventino arranjou uma desculpa e transferiu-os para o Hotel Miramar. Para tanto, solicitou a 15 amigos que se quotizassem para suportar a despesa.
Estas histórias podem ser apreciadas no livro “Os Mal Amados”, de Fernando Dacosta e na obra mais recente, “Marcello Caetano”, de Manuela Goucha Soares. Nestes volumes, relatam-se outros casos ocorridos com Natália. O seu nome deriva do latim Natalis: dia do nascimento. Por isso, é um nome próprio existente em vários países. Tradicionalmente era atribuído a meninas nascidas em Dezembro.