Quando o julgamento está prestes a chegar ao fim e já
se ouviram todas as testemunhas, o juiz dá a palavra para alegações. Primeiro,
pronuncia-se o Magistrado do Ministério Público, que elabora a acusação.
Depois, fala o advogado do arguido.
Enquanto fui docente universitário e formador na Ordem
dos Advogados, sempre chamei a atenção dos meus alunos para a necessidade de se
exprimirem bem e exporem as suas ideias de forma convincente e clara.
Recordava-lhes que, muitas vezes, discutimos pontos de
vista com outra pessoa, explicamo-nos o melhor que podemos, mas acabamos por
ficar com a sensação amarga de não ter vencido.
Uma ou duas horas mais tarde, é que nos lembramos de
determinados argumentos que poderíamos ter utilizado e que teriam derrotado a
visão do nosso interlocutor. A sensação é terrível.
É, por isso, importante, conhecer algumas técnicas de
argumentação.
RADICAL
Um primeiro método consiste em afirmar que a opinião do
nosso adversário é demasiado radical. Toda a gente aprecia o bom-senso e
reconhece que no meio é que está a virtude. Se conseguirmos convencer que a
posição contrária à nossa se situa fora desses limites, ganharemos uma batalha.
Deste modo, depois de o Ministério Público se
pronunciar, o advogado de defesa poderá dizer:
- O Digno Procurador defende que o arguido deve cumprir
dois anos de prisão efetiva. Parece-me que é uma posição demasiado extremista e
fundamentalista. Em meu entender, o tribunal não deve ser tão radical. Poderá
dar uma oportunidade ao arguido e suspender-lhe a pena. Se ele, depois, voltar
a prevaricar, cumprirá a sua pena.
Uma outra alternativa é usar os números. A estatística
é tida como ciência exata e, contra factos, não há argumentos. De um modo
geral, tendemos a pensar que a maioria tem razão. Se formos munidos de dados,
avançamos muito. Imagine-se que o magistrado do Ministério Público, que é, por
assim dizer, o advogado de acusação, afirma:
- Segundo uma sondagem recente, 72% dos portugueses
pensam que é mais grave cometer um crime de dano do que um furto. É que quem
furta, guarda o bem para si ou vende-o. Agora quem se limita a estragar um
objeto de outra pessoa, fá-lo por pura maldade. Portanto, o arguido deve ser
severamente punido.
BIZARRO
BIZARRO
Demonstrar que a posição do nosso adversário é insólita
e invulgar é um método que resulta quase sempre. “É a primeira vez, em quinze anos de carreira, que ouço alguém defender
que há legítima defesa quando a agressão já tinha terminado”: são palavras
poderosas.
Há outro modo de convencer que a opinião contrária não
tem valor. Trata-se de dizer que a conclusão a que o nosso interlocutor chegou
parte de um princípio que não é verdadeiro. A primeira ideia está errada e,
portanto, todos os outros raciocínios que se lhe seguem são falsos. Tudo cai
pela base. Ou seja: partiu-se de um pressuposto errado e chegou-se a uma
conclusão incorreta.
Um advogado de defesa poderá alegar (embora a questão
seja legalmente duvidosa):
- O Ministério Público sabe bem que só pratica o crime
de furto quem subtrai um bem alheio. Ora o Digno Procurador parte da premissa
de que o automóvel retirado pelo arguido é alheio em relação a ele. E depois
conclui que foi cometido um crime. Mas parte de um pressuposto errado. A
viatura foi comprada quando o arguido e a queixosa eram casados. Portanto, é um
bem comum, que pertence a ambos. Não é, por isso, um bem alheio. O arguido
deve, pois, ser absolvido.