A questão do sarampo levanta problemas
legais que já têm sido apreciados a propósito de outras enfermidades
contagiosas.
No domínio da saúde mental, existe
legislação específica que permite contrariar a vontade do doente.
Politicamente, é mais aceitável a privação da liberdade nestes casos, com o
argumento de que a pessoa não está lúcida.
Até na constituição, o caso encontra
acolhimento expresso, como exceção do direito à liberdade. Este não é conferido
a quem seja “portador de anomalia psíquica”, desde que o internamento
seja “decretado ou confirmado por autoridade judicial competente”.
INOCULAÇÃO
A vacina do sarampo esbarra com duas
dificuldades.
Trata-se de uma medida preventiva. Nem sequer
estaria em causa negar
a decisão de alguém realmente enfermo. Seria a
imposição de um medicamento a uma pessoa saudável.
Depois, a matéria já foi amplamente
estudada no passado.
TRATAMENTO
Há quinze anos, quando ressurgiu a tuberculose
no nosso país, o assunto foi muito debatido. Várias pessoas provenientes do
leste europeu recusavam o tratamento.
Quem primeiro me alertou para semelhante
dificuldade, foi a minha prima Paula Fráguas, médica que lidou com estas
complexas situações. Na prática quotidiana, eram resolvidas com o que ficou
conhecido por “toma assistida”. Ninguém forçava fisicamente o paciente a
ingerir o fármaco. Mas ele ficava acompanhado e só saía da unidade hospitalar
após tomar a medicação, na presença de uma testemunha.
Ainda se esboçaram tentativas de elaborar
normas que obrigassem ao tratamento, sobretudo por iniciativa da minha Amiga
Ana Barbado, diretora clínica de uma importante unidade hospitalar.
À direção-geral de saúde competiria
elaborar um anteprojeto da lei.
Porém, tal iniciativa colidiu com pareceres
jurídicos, no sentido de que se trataria de uma medida inconstitucional.
Não se poderia sujeitar ninguém a
internamento por ele indesejado, cerceando-lhe a sua liberdade. Nem sequer
seria viável impor um tratamento ambulatório, que provoca sempre alterações na
integridade física.
SAÚDE
Em nome da saúde geral, não se podem
sacrificar os direitos pessoais.
Em última análise, matavam-se todos os que
sofrem de doenças contagiosas. Acabava-se com a SIDA e a hepatite.
Na eventualidade de não se querer sujar as
mãos, recriava-se uma leprosaria. Foi a decisão de Fidel Castro, na década de
80, para afastar as vítimas da síndroma assassina.
Assim, parece-me claro que não há nenhuma
hipótese de modificar o regime legal. Tal como não há possibilidade de
interpretar a lei vigente por forma a forçar a vacinação. Os pais que quiserem
que os filhos não sejam vacinados verão sempre o seu desejo respeitado.