sexta-feira

PENSAR RAPIDAMENTE



Estado de necessidade, negligência ou dolo: é simples estimar o que ia na mente do piloto que decidiu aterrar na Costa da Caparica, após ter comunicado o seu propósito via rádio.
Ele viu o areal repleto de gente e calculou que ia percorrer uma boa distância a velocidade considerável. Assim como imaginou o que aconteceria se tentasse pousar a avioneta num outro local, incluindo o mar, onde não houvesse tantas pessoas.


JURAMENTO

Importa esclarecer alguns pormenores e seria fundamental ouvir o aluno que seguia no aparelho, junto ao instrutor.
Mas teria de haver declarações formais, precedidas de juramento e registadas de forma a que tivessem a publicidade que a lei impõe aos processos judiciais.
Infelizmente, tal não será possível.
Foi tomada uma decisão irreversível, que assinalou um marco irrevogável, um point of no return, aquele momento em que o comandante de um avião sabe que já não dispõe de combustível suficiente para regressar ao sítio de onde descolou.
Tal ocorreu no instante em que o Ministério Público validou a constituição como arguido do instruendo.
A partir daí, o aprendiz assumiu aquele estatuto que se irá manter até ao final do processo. Por um lado, ele não fica obrigado a prestar declarações, podendo remeter-se ao silêncio. Depois, nunca estará sujeito ao compromisso de jurar dizer a verdade, mesmo que decida apresentar a sua versão do que se passou.


BANHO

Era dia 2 de agosto e estava-se em plenas férias judiciais. As autoridades contactaram telefonicamente a magistrada de turno que orientou os agentes no sentido de procederem à constituição de arguido, relativamente aos dois tripulantes.
Não havia motivo nenhum para que o aluno beneficiasse dos privilégios inerentes a tal situação. Eram completamente inexistentes quaisquer elementos que o ligassem à trágica morte de dois banhistas. Havia uma alusão a falha no motor, mas nada permitia concluir que ele tivesse algo que ver com essa circunstância.
E lá ficaram os dois ocupantes da aeronave sujeitos a termo de identidade e residência.
O caso não era complicado.
No dia seguinte, quando o processo foi entregue ao Ministério Público, bastaria não validar a constituição do aluno como arguido, em face do exame do que estava no expediente policial.
Lamentavelmente, procedeu-se à validação, atingindo-se o tal ponto de não retorno. 
Uma vez sendo arguido, é-se arguido até que o processo acabe.