Os oficiais de abate sofrem particularmente
com os cabritos, que antevêm claramente o seu destino. O seu choro é igual ao
de um bebé humano.
Claro que há um ofício muito pior. É
horrível e não tem comparação possível.
Mas foi abolido em Portugal no século XIX. Subsiste
nalguns países e corresponde às funções do verdugo que executa as penas
capitais decretadas judicialmente.
PÁTIO
Em Lisboa, mesmo em frente à escola dos
juízes, no Largo do Limoeiro, há um pequeno átrio, o Pátio do Carrasco, assim
denominado na toponímia olisiponense por integrar a residência de vários
funcionários da velha cadeia, entre os quais se contava o algoz.
O odioso mister transmitia-se aos
descendentes, no seio de uma família tristemente conhecida, os Alves dos Santos.
Os seus rostos eram ocultados aquando do sancionamento, que era público para aterrorizar
a população e dissuadir quem tivesse intenções semelhantes às do réu.
Nos dias seguintes a cada execução, quando
um conhecido abordava o torcionário, este respondia invariavelmente com uma
desculpa esfarrapada:
- Na verdade, não fui eu. Custar-me-ia
muito fazer aquilo. Paguei a um bêbado, que tem a minha altura, e emprestei-lhe
o capuz.
LOUCURA
No estertor do apartheid na África do Sul,
os mancebos brancos encontravam-se sujeitos ao serviço militar obrigatório.
Frequentemente, tal implicava combater em Angola, com uma elevada probabilidade
de morrer ou regressar estropiado.
A alguns era dada uma alternativa:
- Se não queres ir para a guerra,
arranjamos-te um lugar no centro de enforcamento de condenados à morte.
Tornou-se conhecido o caso de um jovem de
17 anos que enlouqueceu após ter feito essa opção. Compreensivelmente, não conseguiu
suportar o macabro ambiente de trabalho.
Na Roménia, um homem, Ionel Boyeru, insiste ter sido ele a
matar o ditador Nicolae Ceausescu e a sua mulher Elena, no dia de Natal de
1989.
É duvidoso.
O pelotão de fuzilamento era composto por
três soldados. Duas espingardas estavam municiadas com projéteis de salva e somente
a outra arma continha balas letais.
Ninguém sabe quem realmente atingiu o
casal. O sistema tinha precisamente essa finalidade e certamente funcionou.
LISBOA
O mundo evolui e os empregos mais complicados
vão-se extinguido.
Uns quantos colaboradores da Câmara de
Lisboa mudaram completamente de vida.
O seu trabalho é agora a antítese do que
faziam. Além disso, passaram a morar noutra localidade.
Para contar o que se passou, é necessário
relatar um fenómeno curioso que se verifica entre a capital e o Barreiro, na
margem sul do Tejo.
Muitos inquilinos da grande cidade são
despejados, por haver finalidades muito mais rentáveis para os imóveis que
ocupam. O alojamento local, a venda a futuros moradores endinheirados, a
demolição para edificar prédios modernos ou simplesmente um arrendatário
disposto a pagar mais são razões para afastar quem apenas proporciona umas
centenas de euros mensais ao senhorio.
Por outro lado, as casas camarárias têm uma
procura mais acentuada e os critérios da sua atribuição forçosamente tornam-se
mais exigentes.
De maneira que o tecido barreirense está a
ser enriquecido com novos habitantes que, em 25 minutos de travessia de barco,
se colocam no Terreiro do Paço, ficando a pagar €400,00 ou €500,00 todos os
meses por uma casa que, afinal, não se localiza assim tão longe da sua anterior
morada.
Investidores franceses compram apartamentos
por 30 ou 40 mil euros. Depois de uma breve remodelação, o imóvel é colocado no
mercado de arrendamento. Em cinco anos, os proprietários terão o dinheiro de volta
e mantêm-se como donos de uma casa sempre suscetível de se transformar em
dinheiro.
ANIMAIS
Ora esta atraente oferta de habitações
barreirenses para quem não quer adquirir casa própria ou não dispõe de meios
para tal coincidiu com uma evolução no tratamento dos animais errantes de
Lisboa.
Cães e gatos vadios são capturados, mas
acabou o seu extermínio quando não surgia ninguém para os adotar. O município
até conta com uma provedora dos animais a tempo inteiro.
Portanto, os funcionários que antes se
encarregavam da eliminação de cães e gatos ocupam-se agora de modo
completamente diferente.
Recebem um apoio de molde a arrendar uma
casa no Barreiro, com espaço suficiente para acolher amigos de quatro patas.
Cuidam dos animais e têm uma vida relativamente cómoda, pois nem sequer têm de
se deslocar para Lisboa.
Emprego, habitação e bem-estar animal: todos ganham com esta solução.