Aqui já relatei alguns casos em que Francisco Sousa
Tavares, no tribunal e fora dele, adormecia em pleno exercício das suas
funções.
O famoso Advogado Daniel Proença de Carvalho acaba de
lançar um interessantíssimo livro, onde fala do seu colega vinte anos mais
velho, não podendo deixar de mencionar tais situações bem divertidas. Trata-se
da obra “Justiça, Política e Comunicação Social”.
Certa vez, os dois causídicos viajaram para o México,
onde se encontraram com António Champalimaud, a fim de prepararem a sua defesa
contra uma injusta acusação criminal que o forçava a permanecer fora de
Portugal. Ali ficaram durante umas semanas.
O multimilionário achava-se alojado numa habitação
relativamente modesta. Contava, porém, com um escritório para uso dos
defensores. O mobiliário era espartano e não havia senão cadeiras de pau
seboso.
Sem papas na língua, o então marido de Sophia de Mello
Breyner disparou para o cliente e amigo, com quem mantinha informalidade:
- Ó António! Será que já não tens dinheiro para comprar
umas cadeiras decentes?
Pouco antes, o industrial do aço tinha-se visto a falar
para o boneco, enquanto o jurista se entregava a Morfeu. Por isso não resistiu
e replicou:
- Mas tu até dormes nestas cadeiras…
SONO DOS JUSTOS
Noutra ocasião, Proença aceitou a incumbência de
defender o Colega, que ia levado a julgamento pelo crime de abuso de liberdade
de imprensa. Francisco Sousa Tavares dirigia o jornal “A Capital” e as queixas
constituíam banalidade.
Sentado no desconfortável banco dos réus, o arguido
deixou-se dormir.
Entretanto, chegou a vez de o Advogado de defesa usar
da palavra para alegações orais. Olhando para o acusado, disse:
- Senhor Juiz, a prova da inocência do réu está na sua
tranquilidade de consciência. Adormeceu como um inocente.
FERRADO
Amélia Clotilde Lagos era secretária de Francisco Sousa
Tavares. Com ele veio a casar, depois de o Advogado se divorciar da Mãe de
Miguel, o talentoso escritor e comentador televisivo.
O embaixador da China, acompanhado de um intérprete,
decidira fazer uma visita de cortesia ao escritório do Advogado português. A
porta do gabinete ficara aberta. Amélia ia ouvindo os dois chineses, um na sua
língua materna e o outro no idioma de Camões, ambos em tom algo monocórdico.
Até que se fez um longo silêncio.
A assistente assomou à porta e deparou-se com a
verdadeira diplomacia sínica, em todas as aceções da palavra.
Sousa Tavares, sentado no seu cadeirão, dormia.
À sua frente, os dois visitantes aguardavam, mudos e
quedos, até que o repouso terminasse.